Tive um companheiro de trabalho nesta nobilíssima casa de quem guardo saudade. Faleceu há alguns anos mas dele sempre me lembro. Poeta, latinista e helenista, fez-me o favor de reverdecer meu latim e meu grego. Um dia, ao chegar ao trabalho, encontrei sobre a mesa uma quadrinha de versos e um soneto. Reproduzo aqui a quadra, pois o soneto tem uma chave de ouro que não se profere em salão. Esta é quadra: A democracia em Mombassa, merece aplauso e registro. Quando o governo fracassa o povo come os ministros.
Esperemos que os países visitados por Lula nessa sua viagem à África não reeditem a blague da quadrinha, principalmente porque o menu de uma das recepções oferecidas ao presidente mereceu "aplauso e registro".
Vê-se que as repúblicas da África negra são governadas por homens civilizados, que demonstram saber comer e beber e, evidentemente, de dar água na boca ao modesto cidadão Lula, que iniciou a sua vitoriosa ascensão à Presidência com o grito Abaixo a Fome . Na África, onde o fotógrafo canadense Finbarr O’Reilly acaba de ganhar um prêmio por ter flagrado num centro de emergência uma criança com fome pondo a mão na boca da mãe, nessa mesma África é oferecido a um hóspede ilustre um suntuoso banquete com iguarias dignas dos mais exigentes gourmets.
Não sabemos que reflexões fez o presidente Lula diante da mesa na qual se sentou, provavelmente deve ter sido desfavorável sua reflexão, embora seja verdade também que crises de alimentação na África são freqüentes e, infelizmente, não se tem estatísticas das mortes pela fome.
Enfim, o banquete ao presidente Lula deve ter servido ao menos para sua expansão terceiro-mundista e a sua certeza de que a fome está longe de acabar no Planeta Terra. O menu do anfitrião valeu ao menos para essa reflexão.
Diário do Comércio (São Paulo) 15/2/2006