Sem repercussão na mídia, morreu nesta semana o poeta e pintor José Paulo Moreira da Fonseca, um dos expoentes da geração de 45 na poesia e um dos pintores mais valorizados nas artes plásticas, com suas portas que foram abrigadas em grandes museus e nas coleções particulares mais sofisticadas.
O temperamento recluso, o bom gosto em não se promover talvez expliquem o silêncio sobre a sua morte. Não importa. Sua obra, tanto na poesia como na pintura, é dessas que ficam - e isso não é um palpite meu, que nada compreendo de pintura e de poesia, mas daqueles que realmente entendem de uma e de outra expressão da arte. Seu primeiro livro, "Elegia Diurna", marcou o rompimento com aquele modernismo anedótico e iconoclástico que tanto deformou e prejudicou o movimento iniciado em 1922.
Lembro o ano de 1946, quando o conheci no vestibular da PUC, ainda na rua São Clemente, ao lado do colégio Santo Ignácio, onde estudara. Ele morava perto, na Barão de Lucena, com o pai, que foi médico do cardeal dom Sebastião Leme e médico dos seminaristas, inclusive de mim, que tomei muito fosforocalcinoiodato, o remédio que ele gostava de receitar para nossos ossos e neurônios em crescimento - no meu caso, o remédio foi inútil, mas útil foi a convivência com o filho. E com outro rapaz sempre vestido de branco, também ex-aluno do Santo Ignácio e colega de vestibular, Cândido Mendes de Almeida, hoje reitor da UCM e colega de academia.
Eram dois rapazes brilhantes, Zé Paulo já concluíra o curso de direito e se inscrevera no curso de filosofia. Mostrava-me os seus poemas - eu vinha de um meio que recusava o modernismo e me deslumbrava com o domínio do verso sem os atavios dos parnasianos e sem as piadas dos modernistas.
Eduardo Portella o quis na academia, não foi possível. Zé Paulo era mais do que um poeta e pintor. Era um homem íntegro em sua vida, em sua obra, em seu enigma.
Folha de São Paulo (São Paulo) 11/12/2004