Um fim de ano se aproxima novamente. 2024 está para acabar, precisamos começar a pensar o que 2025 vai fazer de nós e o que pretendemos fazer de 2025.
A questão de fazer cinema no Brasil, de sermos cineastas por aqui, é que podemos quase tudo. E por tantas vezes não conseguimos fazer quase nada. Mas pelo menos tentamos adivinhar o que pode acontecer conosco e com o país. Ter consciência do que se passa é pelo menos um conforto muito grande.
Em 19 de junho de 2025, a maior parte de nossos acadêmicos vai estar comemorando os 126 anos de cinema no Brasil. Nessa data estavam sendo exibidas, pelos irmãos Segreto, italianos radicados no Rio de Janeiro, as primeiras “vistas movimentadas” que eles haviam registrado em longas e trabalhosas viagens a Nova York e Paris.
No dia seguinte, o jornal Gazeta de Notícias concedia aos Segreto uma espécie de “certidão de nascimento”, lembrando que, ao entrar na Baía de Guanabara, Afonso Segreto havia fotografado fortalezas e navios de guerra que ali se encontravam.
Essas imagens originais e únicas seriam exibidas na mesma semana na sala que os irmãos mantinham aberta, o Salão de Novidades, na Rua do Ouvidor, destinada ao entretenimento dos cariocas. Essa inauguração ficou conhecida como o Dia do Cinema Brasileiro. Mas hoje, mais do que nunca, já sabemos que nenhum filme brasileiro foi exibido durante a dita semana.
Isso deve nos lembrar do que teria acontecido no carnaval de 1919, o primeiro depois da famosa Gripe Espanhola, a pandemia que entrou para a História por acabar com boa parte da população do Rio de Janeiro.
Segundo Nelson Rodrigues, sua crônica dizia que “desde as primeiras horas de sábado, houve uma obscenidade súbita que contaminou toda a cidade”. Nelson ainda era muito jovem, mas outros escritores, como Mario Filho (“o maior carnaval que já houve, respirava-se um ar de loucura”), Pedro Nava, Austregésilo de Athayde, Carlos Heitor Cony, também produziram testemunhos semelhantes.
Esses dias de folia de 1919, o primeiro carnaval depois da Grande Guerra e da Gripe Espanhola, que haviam liquidado entre 16 mil e 20 mil pessoas e provocado infiltrações em uns 60% da população do Rio de Janeiro.
Quem não havia desaparecido sofria outras evidentes consequências do período. O carnavalesco Julio Silva, por exemplo, tinha se destacado com a criação do Bloco do Eu Sozinho em que repetia o sucesso do que havia inventado para o futebol: “Uma vez Flamengo, sempre Flamengo.” E Caveirinha ganhara o apelido porque, devido à doença que o vitimara, havia emagrecido terrivelmente.
Alguns amigos meus recolhem agora a notícia de um número impressionante de desaparecidos, sem motivo aparente para suas desgraças. Alguns se vão diante do tempo de seus serviços e sacrifícios prestados ao Brasil e à Humanidade. Mas de outros sinto ser cedo demais a partida.
Outro dia, lendo crônica de Pedro Doria, como costumo fazer, dei de cara com a seguinte observação a propósito de alguma coisa referente à inteligência artificial: “Todo texto já escrito pela Humanidade não será suficiente para treinar a quarta geração.”
Essa frase não pode dizer respeito também a esses rapazes desaparecidos?