Bate-bocas e baixarias entre políticos ou pseudos estão se tornando regra, mas não têm nada de original. Afinal, são sujeitos grossos, rudes, muitos vindos dos subterrâneos. O que os redime é que outras categorias também costumam partir para a ignorância, mesmo que, em tese, sejam pessoas educadas. Escritores, por exemplo —eu disse em tese.
Algumas das mais sangrentas querelas literárias brasileiras envolveram os engomados poetas parnasianos e eram resolvidas a bengaladas na rua do Ouvidor. Outras iam até mesmo ao duelo a floretes, como aquele entre Olavo Bilac e o jornalista Pardal Mallet, em 1889 —durou quatro segundos e os dois nunca disseram quem venceu. E trocas de insultos na porta da Colombo eram a toda hora. Os escritores se descompunham gritando "Troca-tintas!", "Suja-laudas!", "Torpe!", "Vil!", "Pelintra!", "Biltre!", "Caolho!".
Mas nem sempre as agressões verbais se davam nesse alto nível. Em 1964, o jornalista e biógrafo R. Magalhães Jr. publicou seu alentado "Rui, o Homem e o Mito", dinamitando com classe as lendas, contradições e mancadas que atribuiu a Rui Barbosa. O livro fez barulho, porque Rui ainda era mais ou menos sagrado —quase todos o admiravam, muitos sem saber por quê. Ato contínuo, dois baluartes do conselheiro baiano, cada qual com um livro, saltaram na arena para defendê-lo: os beletristas Salomão Jorge e Oswaldo Orico.
Nunca me interessei muito pelos argumentos pró ou contra Rui, mas os títulos dos livros-resposta eram fulminantes. O de Salomão Jorge, "O Piolho na Asa da Águia", referia-se ao epíteto Águia de Haia, como Rui ficou conhecido por seu suposto brilho numa conferência em Haia, em 1907. E o de Oswaldo Orico era pior ainda —num insulto hoje inadmissível por xenófobo, intitulou-se "Rui, o Mito e o Mico". O piolho e o mico eram o baixinho, cabeçudo e atarracado cearense Magalhães Jr.
Magalhães, com quem tive o prazer de trabalhar na Manchete dos anos 1970 –sabia tudo de tudo—, reagiu à sua maneira. Riu das ofensas e, enquanto seu livro teve vida longa, os de seus detratores foram direto para os sebos, de onde nunca mais saíram.