O discurso de Lula na Cúpula do Futuro da ONU precisará ser revigorado hoje, na abertura da Assembleia Geral, para que ganhe mais força além da retórica correta e do diagnóstico preciso de que estamos rumo a um “fracasso coletivo”. Se não estivéssemos tão fragilizados devido às queimadas na Amazônia, no Pantanal e noutros biomas, teríamos mais força moral para assumir o papel de bedel do mundo em relação ao meio ambiente, pois temos, na teoria, um Ministério do Meio Ambiente liderado por uma das figuras mais relevantes do setor, respeitada mundialmente, a ministra Marina Silva, e uma equipe técnica das mais competentes.
Além do mais, temos um presidente comprometido com a política de proteção ao meio ambiente substituindo um que, ao contrário, considerava esse um entrave ao desenvolvimento. Na teoria, o discurso de Lula foi correto, com boas posições, mas a falta de liderança na região, a América Latina, enfraquece a retórica. Não apenas não estamos liderando um movimento de políticas climáticas, como temos recaídas em políticas de combustíveis fósseis que deveriam ser desativadas, e não incentivadas, como a exploração da Margem Equatorial na foz do Rio Amazonas.
As incongruências das políticas governamentais trazem também problemas na área externa, especialmente no relacionamento ambíguo com a Venezuela de Maduro. O mundo ocidental de maneira geral repudiou a pretensa vitória de Maduro nas eleições e espera uma solução permanente até o fim do seu mandato, em dezembro deste ano, que não sua permanência na Presidência do país. Se o Brasil, em vez de simplesmente dar de ombros, não pressionar ativamente o vizinho, sinalizará que seu compromisso com a democracia não chega ao ponto de isolar um antigo aliado da esquerda na região que pretende liderar.
A retórica de Lula continua afiada, mas já não basta para lhe dar a liderança regional. Tanto que não estava presente nenhum mandatário dos principais países do mundo no discurso da Cúpula do Futuro, e a palavra do presidente brasileiro foi cortada depois dos 15 minutos regulamentares que cada um tinha para falar. Lula foi ouvido apenas pelos convertidos. Certamente retornará ao assunto na Assembleia Geral da ONU que abre, como sempre faz um presidente brasileiro.
A tradição de abrir a Assembleia, que se deve a Oswaldo Aranha, não tem nenhum valor quando o presidente brasileiro é um arrivista aventureiro, como Bolsonaro. Mas Lula já teve uma dimensão internacional que hoje não corresponde à realidade, apenas a sua história de vida. Isso mostra que a importância do Brasil no cenário mundial, ou de Lula como líder global, é muito relativa, depende do momento, que não é bom para o Brasil, com as queimadas na Amazônia ou a ditadura que vem sendo implantada no nosso quintal.
Sobretudo na questão do meio ambiente, de que o Brasil já foi líder respeitado sob o mesmo Lula, o país poderia estar mais bem posicionado, embora se mantenha como referência, não apenas pela diversidade de nossos biomas e por nosso potencial de energia renovável. Foram os maiores incêndios já registrados nos últimos tempos, mas o país não montou estrutura de prevenção ao fogo e de combate às consequências da mudança climática.
A autoridade climática, proposta encampada por Lula no segundo turno, não aconteceu; só agora o presidente se dispôs a discutir a questão. O Brasil tem os caminhos certos teoricamente, mas na prática ainda não é exemplo — e deveria ser — de país voltado para a energia alternativa e para o combate à poluição. Não se preparou, não tem estrutura, nem legislativa, nem técnica, para levar adiante esse combate. Ainda temos tempo, mas as prioridades têm de mudar.