O ministro da Fazenda de um país afirmar em palestra que avalia a possibilidade de voltar a dar aulas porque o país “é uma encrenca” e “difícil de administrar” geraria uma crise sem precedentes. No Brasil, e é daqui que tratamos, não causou comoção porque Fernando Haddad expressou apenas o sentimento de boa parte do PIB e da classe média brasileira, que já desconfiavam há bastante tempo de que ele não tinha apoio interno para realizar as reformas necessárias.
O PT não sabe governar sem cisões e disputas internas, e mais uma vez vemos isso acontecer, num momento em que a liderança de Lula é declinante, embora ainda prevaleça sobre as demais figuras partidárias — ninguém para superá-lo, mas muitos já sem o temor de confrontá-lo. Esse confronto se dá por uma posição anacrônica da esquerda petista, que não se conforma com a necessidade de contenção de gastos para equilibrar as contas públicas.
Fazer reajuste “em cima dos pobres”, não, dirá Lula, ecoando esse raciocínio que constrange quem quer preparar o país para um desenvolvimento sustentado de longo prazo justamente para ajudar os mais pobres. Claro que os ricos e a classe média abastada também se beneficiarão, mas um crescimento saudável e equilibrado deve ser o objetivo final de qualquer governo, de direita ou de esquerda.
Lula tem o mérito de ter colocado o país de volta ao convívio internacional, como agora, quando participou como convidado da Conferência do G7 na Itália. É um ambiente de que ele gosta e que gosta dele. Sua imagem externa hoje é melhor que a interna, porque lá fora ele defende teses consensuais, como o fim da desigualdade, a preservação do meio ambiente, o fim da carbonização. Quando fala, nesses encontros internacionais, sem preocupação com a consequência de suas palavras, Lula se sai bem.
Mas o que fala não combina com o que faz e, no final das contas, não tem sequência. Nada termina favoravelmente. Aqui no Brasil, quer explorar petróleo. O programa de desenvolvimento brasileiro é mais baseado no petróleo que em energias alternativas, que são o futuro. O Brasil não tem nada de concreto em relação às políticas de energia renovável. A Petrobras é uma empresa forte e competente e conseguirá tirar petróleo na Margem Equatorial, que abrange a Bacia da Foz do Amazonas.
Mas é uma empresa de energia apenas no marketing, na prática é de petróleo, passado que não sustenta um país no longo prazo. Lula não tem conseguido fazer políticas que levem a uma expectativa boa de futuro das energias renováveis. Ao contrário, a política dele e do PT desenvolvimentista põe o mercado e os agentes financeiros no desequilíbrio entre a prática e a teoria, levando a preocupações.
Vale o que fala Fernando Haddad, ministro da Fazenda, ou Gleisi Hoffmann, presidente do PT? Lula fica de um lado para o outro e não se define. Se definisse agora, seria na base do “gasto é vida”, que já deu errado no governo Dilma, em consequência do desgoverno com início no que ele fez no final de seu segundo mandato para eleger Dilma na base do crescimento econômico forjado em medidas artificiais.
Dilma recebeu um país completamente descontrolado nas contas públicas e aprofundou a crise. Estamos novamente nesse simulacro de crescimento, com números bons e expectativas futuras ruins, diante do descontrole das contas públicas. O papel de Lula no exterior também tem reflexos na economia interna, pois a tendência para a esquerda, que já fora marcante nos primeiros mandatos, leva o Brasil a ser visto como aliado de forças antiocidentais como Rússia, China e países e forças associados à esquerda, caso do Hamas.
Se compararmos a política externa brasileira no governo petista à do governo Bolsonaro, teremos mais consistência na atual, mesmo que a esquerdização seja considerada uma opção equivocada. Mas note-se que, para ser pragmático, não é necessário ser de esquerda. Foi na ditadura militar que o Brasil reatou com a China. Basta que o interesse nacional esteja acima da politicagem.