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Títulos rutilantes

 

Outro dia, em conversa, citei um verso não me lembro de quem a respeito de não me lembro o quê, e um amigo, desses que vivem às vésperas do Apocalipse, me repreendeu: "Poxa, poesia numa hora dessas?". De fato ---vacilei. Com toda a melhora dos últimos tempos, com uma tentativa de golpe de estado sendo investigada pelos parâmetros de uma democracia, quem garante que os agentes das trevas tenham sido derrotados? E, no caso, por que não usar a poesia como lanterna? Então me lembrei de como muitos livros dos nossos poetas, com as imagens luminosas de seus títulos, já nos ajudaram a levar a vida.

Alvares de Azevedo escreveu a "Lira dos Vinte Anos" (1852), como se adivinhasse que morreria com esta idade. Outros viveram mais para celebrar: Casimiro de Abreu, com "Primaveras" (59); Castro Alves, com "Espumas Flutuantes" (70); Machado de Assis, com "Falenas" (70) —falenas são mariposas, que nascem lagartas e se transformam em belos seres alados. Augusto dos Anjos, com "Eu" (1912), de modo a não restar a menor dúvida; e Olavo Bilac, com "Tarde" (19), quando, para ele, já era quase noite.

Adoro "Mulher Nua" (22) e "Meu Glorioso Pecado" (28), de Gilka Machado, "Gritos Bárbaros" (25), de Moacyr de Almeida, e "Jogos Pueris" (26), de Ronald de Carvalho. "La Divina Increnca" (24), de Juó Bananere, e "Caldo Berde" (30), de Furnandes Albaralhão.

E vibro com "Carnaval" (19) e "Libertinagem" (30), de Manuel Bandeira; "Losango Cáqui" (26), de Mário de Andrade (que já ouvi citado como "Losango Caqui", referente à fruta); "A Túnica Inconsútil" (38), de Jorge de Lima; "Vaga Música" (42), de Cecília Meirelles; "Fazendeiro do Ar" (54), de Carlos Drummond; "A Luta Corporal" (54), de Ferreira Gullar; "Uma Faca Só Lâmina" (56) e "A Educação pela Pedra" (66), de João Cabral. Títulos fortes, não?

E, por favor, não me diga que faltou este ou aquele. Faça a sua lista.

Folha de São Paulo, 02/03/2024