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A universidade assassinada

 

Grande ano para a educação no Brasil, 1934. Nasceram duas importantes universidades: a USP, de São Paulo, e a Universidade do Distrito Federal, do Rio. A primeira está fazendo 90 anos. A segunda não teve essa oportunidade.

A UDF, como era chamada, foi criada pelo educador Anísio Teixeira, com o apoio do prefeito Pedro Ernesto. Começou com cinco faculdades e reunia um corpo docente nunca visto no Brasil: entre outros, Gilberto Freyre, Arthur Ramos, Heloisa Alberto Torres, Alvaro Vieira Pinto, Gastão Cruls, Sergio Buarque de Hollanda, José Oiticica, Lucio Costa, Cecília Meirelles, Candido Portinari, Arnaldo Estrela, Heitor Villa-Lobos e 12 franceses que Afranio Peixoto, seu reitor, foi buscar em Paris. Todos de notório saber, contratados sem concurso.

Ela era diferente e experimental. Não se propunha a formar "elites dirigentes", mas o contrário: a educação deveria ser de base. Começou com 500 alunos e uma enorme variedade de cursos opcionais em cada faculdade. As provas parciais, à base de interpretação e não de decoreba, permitiam a consulta a livros. E defendia o ensino laico —sem educação religiosa.

Por causa disso, a UDF sofreu a perseguição quase insana do líder católico Alceu Amoroso Lima, para quem todos ali, a começar pelo jovem Anísio, de formação jesuíta e admirador da educação americana, eram comunistas. Com o levante comunista frustrado de novembro de 1935, a UDF teve professores e alunos presos por até um ano. Isso deu pretexto ao ministro da Educação Gustavo Capanema —que temia o prestígio e a independência de Anísio— para afastá-lo e esvaziá-la. Em 1938, Capanema, incrivelmente, nomeou Alceu como reitor, no que muitos professores se demitiram. Capanema então transferiu várias de suas faculdades para a Universidade do Brasil, sob seu domínio, e, em 1939, fechou de vez a UDF.

Impossível calcular o que ela seria hoje.

Folha de São Paulo, 14/02/2024