Televisão, para mim, é para ver futebol, noticiário e comerciais de automóveis. Não me confunda: nunca liguei para carros e mal sei distinguir um fusca de um caminhão-cegonha. Mas não resisto àqueles comerciais em que os últimos modelos, em vez de se anunciarem como macios, sensuais e econômicos, hoje parecem tanques que se deslocam com a força, a brutalidade e a velocidade da Fórmula 1.
São veículos hostis. Levantam poeira no deserto, atravessam cachoeiras, desafiam crateras, arrostam atoleiros, esmagam a vegetação e dão cavalos de pau como se seus motoristas tivessem aprendido a dirigir com Indiana Jones. E, para que não se diga que essa intrepidez ao volante é um atributo de machos, alguns desses motoristas são mulheres. Pergunto-me se, para protagonizar essas emoções, o comprador de tais bólidos não terá de se mudar para a Ucrânia ou para a Faixa de Gaza. Não vejo possibilidade de viverem aventuras parecidas nos engarrafamentos do Rio ou de São Paulo.
Pergunto-me também por que as pessoas ainda têm tanto fascínio pela velocidade. Nos primórdios do século 20, quando os carros eram novidade, ainda se justificava. A velocidade era o novo e, em 1909, inspirou o futurismo do italiano Marinetti. Para ele, o carro, o avião e as máquinas tinham superado a Odisseia, a Capela Sistina e a Quinta Sinfonia. A ideia era passar o trator na cultura. Havia muito de fascismo nessa estupidez, e não à toa o fascismo foi uma variante do futurismo.
Se o deslumbre pela velocidade está de volta, devíamos relançar a Fon-Fon.