Marqueteiros ligados ao PT estão trabalhando com afinco, e ajuda da IA (Inteligência Artificial), para conseguir reverter o “efeito Orloff” na eleição presidencial deste domingo. Nos anos 1980, uma propaganda de vodca originou no Brasil a expressão “efeito Orloff”, pois todos os erros cometidos na economia argentina acabavam se reproduzindo no Brasil. A mensagem básica da propaganda resumia-se a uma frase — “eu sou você amanhã” — para evitar a ressaca por beber uma vodca de má qualidade.
A Argentina hoje está na mesma situação em que o Brasil já esteve. Se vencer o ultradireitista Javier Milei, será assim como em 2018, quando aqui surgiu o fenômeno bolsonarista, e Fernando Haddad representava o petismo, com Lula na cadeia. Na Argentina é o peronismo do candidato Sergio Massa, que tem várias facções, que está sendo contestado por um outsider completamente fora dos padrões, Javier Milei.
Os eleitores argentinos sabem que farão uma escolha de Sofia, chamam de Frankenstein contra Drácula. A situação hoje, porém, é mais parecida com a de 2022, porque a vitória de um ou outro será muito apertada, segundo a previsão preponderante nas diversas pesquisas de opinião. Há pesquisa para todos os gostos. Várias promessas de Milei não podem ser cumpridas, e ele já está voltando atrás com a ameaça de rompimento com o Brasil, ou de exterminar o Banco Central.
A possibilidade de prevalecer o “efeito Orloff” acabou tirando a possibilidade de o Bolsonaro argentino, Milei, ser eleito no primeiro turno, talvez de ganhar a eleição presidencial da Argentina. Nós cometemos o erro primeiro, e nossos “hermanos” foram alertados por propagandas muito bem feitas, comparando Bolsonaro e Milei, mostrando os efeitos deletérios da passagem do Milei brasileiro pelo governo.
Nas primárias, parecia que os eleitores, diante da crise interminável, preferiam a incerteza. No primeiro turno, pareceu que escolheram o “menos pior”, como fazemos aqui há muito tempo. Mas a recuperação de Milei dá indicações de que a dúvida atroz persiste neste segundo turno. Assim como pesquisas, há piadas para todos os gostos. Comparam o eleitor a um homem baleado que, chegando ao hospital, se vê diante de um dilema: escolher o médico inexperiente, sem diploma, desequilibrado, que quer amputar o braço mesmo que o tiro tenha sido na perna, ou outro médico, experiente, que fala manso, mas foi quem lhe deu o tiro.
A Argentina é tão “indecifrável”, na definição do ex-presidente do Uruguai José Mujica, um ícone da esquerda, que o ministro da Fazenda de um governo falido pode vencer a eleição. A explicação, segundo Mujica, é a existência do peronismo como mitologia. O problema da eleição presidencial na Argentina é saber para onde vai o eleitorado da terceira colocada, Patricia Bullrich, apoiada por Mauricio Macri. Ela anunciou apoio a Milei, dizendo que gostaria de ajudar a derrotar o peronismo representado pelo ministro da Fazenda Sergio Massa.
Milei é muito radical, o que limita as negociações. Precisará recuar para fazer acordos, mas se recuar demais pode decepcionar seu eleitorado, a maioria jovem, que apoia sua retórica anarquista. Foi nessa corda bamba que ele se equilibrou durante a campanha, e conseguiu chegar ao dia da eleição recuperando terreno perdido no primeiro turno em relação às primárias.
A luta na Argentina como sempre é contra ou a favor do peronismo, fenômeno de décadas e décadas em torno do qual a política argentina continua se desenrolando. Existe peronismo de direita, de esquerda, de centro. O PT empenha-se no apoio ao peronismo, o bolsonarismo apoia Javier Milei, transferindo para a Argentina uma disputa interna que está longe de terminar.
PS - Na coluna de domingo passado, sobre a guerra de Israel contra o Hamas, escrevi Iraque no lugar de Irã. Corrigi na edição online, mas devia uma explicação aos leitores do impresso.