Não há mais projeto do Estado no Brasil, só projetos de governo. Os únicos projetos de Estado que vingaram nos últimos anos foram o Plano Real e o Bolsa Família. Mesmo assim, o Real foi combatido por diversas correntes políticas, e só se impôs pela eficiência demonstrada. O Bolsa Família tem suas raízes nos programas sociais do governo Fernando Henrique, todos agrupados no primeiro governo Lula. Sua permanência no governo Bolsonaro, embora com outro nome e distorcido na falta de focalização da distribuição de recursos, só demonstra sua necessidade.
Os recursos da educação e da saúde, obrigatórios pela Constituição de 1988, começam a ser alterados pelo governo Lula, que proporá um novo critério, mais flexível. Pode ser um aperfeiçoamento de uma política de Estado de valorização do ensino, mas só saberemos depois da proposta. O Brasil avança, depois recua; é um problema nosso. Cada governo que entra quer fazer seu próprio programa.
Temos hoje dois exemplos de políticas públicas fundamentais que estão sendo alteradas por questões políticas: a suspensão da reformado ensino médio, e a mudança no marco do saneamento básico. A reforma do ensino médio, aprovada no governo Temer, na teoria é muito boa, um avanço e superação de um sistema anterior que deu errado sempre.
O Brasil é medido internacionalmente como medíocre, quando não abaixo da média, em matemática, português e leitura, por exemplo. Nossas notas nos sistemas internacionais como o Pisa são pavorosas, o que prova que nosso sistema educacional não funciona. No Ceará do ministro Camilo Santana, houve avanços na educação porque se empenharam para melhorar o ensino, e equipar as escolas.
A esquerda da educação sempre criticou essa reforma, porque foi feita pelo Temer, por medida provisória, e depois foi sendo implantada por Bolsonaro sem controle, porque ele nunca deu atenção à educação. À solução não é suspender e atrasar, é resolver os problemas que existem, investir mais em estrutura escolar, em tecnologia, que é sempre necessário. Não é acabando com uma reforma, um progresso no sentido de que o aluno vai se interessar mais por temas específicos que vão moldar seu futuro, do que por um ensino genérico que não ensina nada a ninguém, que se vai resolver nosso principal problema. E um erro do governo e um hábito brasileiro interromper programas para dar a eles 'a cara' do governo da ocasião. Assim, não vamos a lugar nenhum.
O caso do saneamento básico é o mesmo. Mudam-se as regras, que já estão sendo usadas, com o jogo em andamento. Para atender aos interesses corporativos de empresas estatais e de sindicalistas. O presidente da Câmara, deputado Arthur Lira, já avisou que o Congresso não está disposto a mudar projetos já aprovados, e certamente a disputa do PT será difícil de ser vencida. O fato de a Sabesp, do governo de São Paulo, e a Copasa, de Minas Gerais, terem se desfiliado da Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento (Aesbe) mostra que estados que são favoráveis ao incentivo dos investimentos, públicos ou privados, dos serviços de saneamento não darão apoio político, nem parlamentar, a alterações que interessam apenas aos grupos políticos enraizados nas empresas estatais.
A Aesbe vem batalhando pela revogação do marco regulatório do saneamento desde a eleição de Lula, e suas posições são consideradas pelas empresas estatais dissidentes 'incoerentes como avanço do saneamento no Brasil, onde cerca de 100 milhões de pessoas não têm coleta de esgoto e 35 milhões não têm acesso a água tratada', segundo dados do Instituto Trata Brasil. A Sabesp, uma empresa de capital misto com ações na Bolsa de Valores de Nova York e no segmento Novo Mercado da B3, é responsável por um terço de todo o volume de recursos aplicados em saneamento no país - para os próximos cinco anos, pretende investir R$ 26, 2 bilhões. Fornece água, coleta e tratamento de esgoto a 375 municípios do Estado de São Paulo, sendo uma das maiores empresas de saneamento do mundo.
É um erro do governo e um hábito brasileiro interromper programas para dar a eles 'a cara' do governo da ocasião.