Nenhum filósofo me infunde tanta paz. Os antigos ensaios de seu rosto, de autoria incerta e duvidosa, parecem confirmar tal sentimento. Como na Vida de Porfírio, como na Escola de Atenas, de Rafael, assistimos a um Plotino, solitário, a sorver as primícias da contemplação.
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Um mundo em ascensão. Desperta o sobrevoo de domínios transparentes. Esplende um sentimento vertical. Promessa de asas e altitude: Έπτερωμένος.
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Eros atrai ao mundo hiperceleste. A alma, como Ulisses, não esquece sua origem. É como quem regressa ao ponto de partida. Saudosa do Uno, “toda a alma é uma Afrodite”.
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Convém notar que existe mais de uma Afrodite. Uma é a terrena deusa, enquanto a outra, diáfana e sutil, procura com ardor o mundo celestial.
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Amantes são aqueles que contemplam uma determinada forma. E dela, pouco a pouco, se aproximam.
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O lema de Plotino me avassala: fugir de solidão a solidão. Como quem diz: φυγὴ μόνου πρὸς μόνον. A nostalgia do Uno e as cercanias abissais.
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A não-música do Uno e seu ritmo: gerador de todas as coisas, não é nenhuma dessas coisas, nem quantidade ou qualidade, nem alma, nem intelecto, não é móvel nem imóvel, sendo anterior a tudo, precede espaço e tempo. Não há conceito apto a pronunciá-lo. Ó melodia, afônica e sublime!
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Como dizer o Uno? Como tributá-lo? E o pensamento, náufrago, deserta.
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A vida dos celestes e mortais consiste em esquivar-se da matéria. E abandonar as ilusões remanescentes. Uma Afrodite enamorada do intangível!