O resultado da eleição municipal, nem bem terminou o primeiro turno, já tem consequência na retórica partidária. O PP, que elegeu mais prefeitos dentro do Centrão, quer levar Bolsonaro a filiar-se a ele, garantindo o protagonismo do processo eleitoral até 2022. O PSD, outro partido do grupo que teve bons resultados municipais, ao contrário, já avisou que pode ter candidato próprio na eleição presidencial.
A relação entre PP, PSD, MDB e DEM é antiga, elegeu Rodrigo Maia presidente da Câmara. A diferença entre os dois grupos é muito menor do que entre o Centrão e Bolsonaro. Bolsonaro é outra turma, é da extrema direita. O centrão se adapta a qualquer governo. Trabalhou com Lula, Dilma, FH. Não é um partido ideológico, é pragmático e quer estar no poder. À medida em que a coisa for caminhando, acho que tem mais chance de o centrão se alinhar ao DEM e ao MDB do que seguir com Bolsonaro até a eleição.
Inclusive porque Bolsonaro hoje é mais dependente de Centrão do que o Centrão de Bolsonaro. Bolsonaro não tem o que fazer, porque não tem apoio organizado no Congresso, como o PT, que tinha base, e a esquerda ao lado, e mesmo assim perdeu. Bolsonaro não tem ninguém. Enquanto puder ficar do lado governo, tirando vantagens de nomeações e ministérios, o Centrão vai aproveitar, estará no lugar certo no momento certo se Bolsonaro for bem sucedido.
Se o vento mudar, lá estará o Centrão na oposição. Restará a Bolsonaro “romper” com o Centrão, voltando a seu discurso de crítica de “velha política”, mas agora sem credibilidade. É uma situação incômoda para Bolsonaro, muito cômoda para o centrão. O DEM está há muito tempo ajudando Luciano Huck. Maia e ACM Neto têm reuniões frequentes com ele. Tudo se encaminha para o lançamento de uma candidatura própria do Luciano Huck, com o DEM apoiando. Roberto Freire, o presidente do Cidadania, também está muito próximo de Huck, e há a possibilidade de uma aliança com de centro-esquerda, com a direita embarcando. Ou simplesmente uma chapa de centro-direita, com o apoio de diversos partidos.
Teríamos, então, dois candidatos ao centro. O governador João Dória tem um partido forte como o PSDB, teve vitória arrasadora em São Paulo, com a eleição de prefeitos e vereadores pelo interior do Estado, e tem Bruno Covas favorito na cidade de São Paulo. O PSDB perdeu 30 por cento das prefeituras, mas continua sendo o quarto partido que mais elegeu prefeitos.
Rodrigo Maia já disse que Moro é de extrema-direita e não quer conversa com ele. Mas Doria quer, e pode perfeitamente lançar uma chapa forte com Moro. Provavelmente, ficarão pelo menos esses dois grupos de centro-direita, com a dificuldade de alianças no primeiro turno. No outro lado, Bolsonaro e ainda várias esquerdas.
Se Lula abrir mão de ter o PT como protagonista, as outras legendas de esquerda terão mais chances. É interessante, Lula é autoritário, não deixa ninguém crescer do lado dele, não quer fazer acordo com ninguém, mas continua sendo a grande figura da esquerda brasileira. Ao mesmo tempo, se abandonar Lula, o PT é um partido em decadência, e o PSOL é o PT do início.
Lula perdeu três vezes antes de chegar à presidência, porque liderava um PT mais radical. Até chegar ao ponto de o PSOL ter capacidade de negociar, fazer acordos, vai demorar muito. Nascido de uma dissidência do próprio PT contra a corrupção no mensalão, o PSOL está a caminho de predominar na esquerda brasileira, sem a pecha de “clientelismo governamental, negócios por baixo do pano e propinas na casa dos bilhões”, como definiu o ex-presidente americano Barack Obama em seu novo livro, o mesmo que um dia disse que Lula era “o cara”.