Não foi a primeira vez, não será a última. A disputa de poder entre o ex-superministro da Economia Paulo Guedes e o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, se desenvolve no terreno pantanoso da crise econômica que mais uma vez vivemos. Não há dinheiro para investimentos, para programas sociais, e a disputa entre os “desenvolvimentistas” e os “monetaristas” volta à tona, como acontece com freqüência quando há crise econômica.
No governo João Figueiredo, aconteceu a disputa entre o ministro do Planejamento, Mario Henrique Simonsem, e o da Agricultura, Delfim Netto. No governo Fernando Henrique, houve o embate entre o ministro do Desenvolvimento Clóvis Carvalho e o da Fazenda, Pedro Malan. No primeiro caso, perdeu o Planejamento, no segundo, ganhou a Fazenda.
Num governo em que a linha econômica era definida por Guedes, incontestável em certo momento, seria impossível que o ministro Tarcisio Freitas, da Infraestrutura, conseguisse verbas para obras com o apoio de ministros “da casa”, como os generais Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, e Braga Netto, da Casa Civil. Mas foi o que aconteceu.
O ministro do Desenvolvimento, Rogério Marinho, uniu-se aos militares desenvolvimentistas e montou sua base longe do ministro da Economia Paulo Guedes, que o havia indicado para o cargo depois de tê-lo como assessor durante a reforma da Previdência.
Era o começo do fim de mais um superministro do governo Bolsonaro. A disputa de bastidores ontem chegou ao público com o vazamento de uma palestra do ministro do Desenvolvimento para uma platéia de economistas de uma corretora de valores. Provavelmente de propósito, já que é um político experiente, Rogério Marinho criticou seu colega de governo e principal figura da economia, aparentemente como troco à atitude de Paulo Guedes de renegar a utilização de precatórios para financiar o Renda Brasil.
Marinho garantiu que a idéia foi de Guedes, que realmente esteve na reunião com os políticos onde se definiu a composição do programa social, e, no anúncio oficial ao lado do presidente. O ministro Rogério Marinho, sentindo-se respaldado, disse aos economistas que o programa sairá “do melhor ou do pior jeito”, o que deu a impressão aos investidores de que estava avisando que o Renda Brasil sairá mesmo que fure o teto.
Há informações de que Marinho está negociando com os políticos retirar o programa social do teto de gastos, e criar um imposto que possa financiá-lo. Os políticos não querem mais conversa com Guedes, se consideraram traídos com a mudança de atitude sobre os precatórios.
Marinho ainda teria feito, segundo as versões, comentários nada elogiosos à capacidade técnica do ministro Paulo Guedes. Ao saber, pelos jornalistas, das críticas, Guedes chamou Marinho de “desleal”, “despreparado” e “fura-teto”, estabelecendo os campos de ação de cada um.
Caberá ao presidente Bolsonaro decidir a parada, como coube a Fernando Henrique demitir Clóvis Carvalho para reafirmar a predominância do ministro Pedro Malan na política econômica. Carvalho havia feito um discurso em reunião do PSDB, na presença de Malan, com críticas à política econômica, chegando a dizer que “cautela, a partir de certo ponto, é covardia”.
Foi assim também em 1979, quando a disputa entre o ministro do Planejamento, Mario Henrique Simonsem, e o da Agricultura, Delfim Netto, acabou com o pedido de demissão do primeiro. Delfim foi para o ministério do Planejamento, indicou o novo ministro da Fazenda, Ernane Galvêas, e assumiu a direção da economia.
O presidente Bolsonaro encontra-se na mesma situação de Figueiredo, esperando que alguém peça demissão. Tudo indica que não há espaço para os dois no mesmo governo, que já não é o mesmo de quando Paulo Guedes era o Posto Ipiranga. Já não parece estar em condições políticas para conseguir a demissão de Rogério Marinho, que tem o apoio dos ministros militares do Palácio do Planalto e do Centrão.