A alta da popularidade do presidente Bolsonaro, confirmada pela pesquisa Ibope/CNI divulgada ontem, traz um paradoxo para o governo. Ao mesmo tempo que revigora sua força política, obriga-o a obter a aprovação para o novo programa social que entraria em vigor no início do ano que vem, quando termina a vigência do auxílio emergencial da pandemia.
A pesquisa deixa claro que foi esse auxílio que alavancou a popularidade de Bolsonaro. Uma das maiores altas na popularidade do presidente foi registrada entre os com renda familiar de até um salário mínimo, com a avaliação do governo como ótimo ou bom, passando de 19% para 35%. Outros 31% nessa faixa de renda ainda acham o governo ruim ou péssimo.
Por regiões, Bolsonaro ainda não é “o pai de todos” no Nordeste, mas já conseguiu empatar com a desaprovação, embora ainda seja esta a região onde ele é menos apoiado. Um ponto de alerta para ser observado é que a pesquisa do Ibope foi realizada antes da primeira parcela reduzida do auxílio emergencial, que cairá de R$ 600 para R$ 300 a partir do mês que vem.
A proposta inicial do ministro Paulo Guedes, da Economia, era de um auxílio de R$ 200, que o Congresso elevou para R$ 500. O presidente Bolsonaro, para não perder a hegemonia do processo, aumentou então o auxílio emergencial para R$ 600, sem mesmo consultar Guedes.
Esse aumento que triplicou o auxílio emergencial trouxe dividendos eleitorais ao presidente, mas agora lhe impõe a necessidade de manter pelo menos os R$ 300, sem que haja nem mesmo a possibilidade de saber o impacto da queda pela metade do auxílio.
A força dos R$ 600 é tanta que, mesmo a pesquisa tendo sido realizada durante o período em que a inflação cresceu devido aos alimentos, esse baque não teve conseqüências maiores para aqueles que haviam melhorado de capacidade aquisitiva.
A redução do auxílio emergencial, embora inevitável devido à impossibilidade de permanecer fornecendo um programa social deste tamanho pode afetar a credibilidade do presidente junto a esse público que hoje tem uma avaliação mais favorável a seu governo. A pesquisa do Ibope mostra que, apesar de 51% dos pesquisados aprovarem a maneira de governar de Bolsonaro, também 51% não têm confiança no presidente.
Entre aqueles que recebem até 1 salário mínimo, essa desconfiança é maior que a média, de 55%, da mesma maneira que entre os de mais alta renda, cujo grau de desconfiança chega a 62%. Essa atitude significa uma postura cautelosa dos mais pobres diante do novo benfeitor, que terá que confirmar sua magnanimidade com fatos concretos.
Os de mais alta renda desconfiam mais, os de baixa renda apoiam desconfiados. É essa desconfiança que motiva as manobras políticas do governo para aprovar a Renda Cidadã, receando que Bolsonaro não consiga assumir como seu o programa social que está sendo identificado como uma ampliação do Bolsa-Família.
O problema a superar é a necessidade de cortes para viabilizar o Renda Cidadã, pois o teto de gastos, que foi criado por uma emenda constitucional, só permite o aumento de gastos com um corte do orçamento, que só é reajustado pela inflação. Por isso o ministério da Economia estuda diversas maneiras de mudar por dentro do orçamento a distribuição das verbas.
A desindexação de alguns benefícios, e o corte de outros, como os das empresas do Simples, estão na lista de medidas que podem ser adotadas. A negociação parlamentar será ajudada certamente pela constatação da popularidade do presidente, e foi por isso que o líder do governo Ricardo Barros foi tão enfático ao afirmar, dias atrás, que o teto de gastos não será tocado.
A possibilidade de alteração nos critérios do teto de gastos, para permitir que a renda de um novo imposto sobre transações digitais possa ser usada para aumentar o orçamento, tem provocado reações negativas no meio financeiro. Os juros de longo prazo já estão subindo, demonstrando que os investidores temem que o equilíbrio fiscal não seja mantido.