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Sem explosão

 

O discurso do presidente Jair Bolsonaro hoje, na abertura da Assembleia da Organização das Nações Unidas (ONU), não terá surpresas, pois continuará defendendo suas teses sobre meio ambiente, preservação da Amazônia (na foto), e também sobre a pandemia da Covid-19, mas não será agressivo em relação direta aos críticos dessas mesmas políticas.  

A denúncia do ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) General Augusto Heleno, na audiência pública do STF para tratar do atraso na aplicação de recursos do Fundo do Clima, de que as críticas de nações estrangeiras sobre a Amazônia têm o objetivo de “prejudicar o Brasil e derrubar o governo Bolsonaro”, não deve ser a linha do discurso, mesmo porque, segundo o senador Nelsinho Trad, presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, “ali não é lugar para essa política”.  

O senador diz que tem alertado o Palácio do Planalto para a crítica generalizada que ele ouve de delegações de diversos países europeus sobre nossa política de meio ambiente, e acredita que o presidente Bolsonaro vai aproveitar seu discurso para tentar melhorar a imagem do país no exterior.  

Não será um discurso de conciliação, mas uma tentativa de mostrar números e dados que sustentem sua afirmação de que o Brasil é o país que mais preserva o meio ambiente, ou que o país se saiu bem na pandemia da Covid-19, tanto na proteção dos mais vulneráveis, quanto na recuperação econômica.  

Pelas informações que circulam, a estratégia do governo será não confrontar as nações que criticam o Brasil, a não ser indiretamente, na defesa de seus pontos de vista, que continuarão sendo combatidos por organismos internacionais e ONGs. É uma boa ideia, porém, apresentar seus argumentos sem acusar os outros.

Parece que Bolsonaro já entendeu que precisa conviver com organismos multilaterais, mesmo que não goste do que representam. Por isso nos últimos dias o Brasil apoiou os Estados Unidos no BID, abrindo mão de indicar um candidato ao posto, e em outros organismos interfere nas nomeações.  

Mesmo assim, em temas fundamentais como mudança climática, preservação da Amazônia, as posições do Brasil continuarão confrontando a visão majoritária na ONU, que dias atrás debateu uma proposta do relator especial Baskuit Tunkat para que o Conselho de Direitos Humanos enviasse uma equipe para verificar a situação da política ambiental e de direitos humanos.  

O governo brasileiro reagiu duramente, embora, dias antes, tenha aprovado igual proposta em relação à Venezuela. Tal proposta não tem viabilidade de ser aprovada, mas sinaliza uma posição crítica dos gestores da ONU ao governo brasileiro.  

Nada indica, porém, que o presidente Bolsonaro leve para seu discurso um embate direto, embora a defesa de suas posições represente uma resposta a essas críticas. Outro ponto relevante de seu discurso deve ser a defesa da atuação de seu governo no combate à pandemia da Covid-19, refutando acusações de que teria provocado um genocídio ao não atuar com firmeza logo no início da pandemia.  

O discurso de Bolsonaro será afetado pela discussão interna sobre a visita do Secretário de Estado dos Estados Unidos, Mike Pompeo, a Roraima, fronteira com a Venezuela, para atacar a ditadura de Maduro.  

Um manifesto de ex-chanceleres brasileiros apóia o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, na crítica à visita do secretário americano, que foi mesmo completamente absurda. O Brasil aceitou fazer parte de uma manobra política dos EUA contra um país vizinho, às vésperas da eleição presidencial americana. Não importa que não se concorde com a Venezuela, e até ache que ela é uma ditadura, mas não se pode autorizar o território nacional para, militar ou politicamente, atacá-la.  

Há quem tema que o presidente Bolsonaro use seu discurso para mandar apoio à reeleição do presidente Trump. 

O Globo, 22/09/2020