Estou quase dizendo como Zeca Baleiro: “Ando tão à flor da pele que qualquer beijo de novela me faz chorar”. Não chego a tanto, mas ando triste, muito triste. Por tudo — pela cidade, pelo estado, pelo país, pelo futuro e pela perda de parentes e amigos. O mais recente foi Washington Novaes. Éramos cinco na antiga revista “Visão” e hoje somos apenas dois e um retrato na parede, ou melhor, um desenho, feito pelo outro que sobrou, Ziraldo (éramos os Z que encerrávamos os manifestos contra a ditadura militar). Os demais do quadro são Aloysio Biondi e Cláudio Bueno Rocha.
Agora entendo o que meu pai dizia, aos 98 anos, a respeito de viver muito. “O problema é que você vai ficando sem ter com quem conversar sobre o seu tempo”. Zezé Ventura era o mais sábio pintor de paredes do mundo. Nisso toca o telefone. Era uma mulher anunciando: “Aqui quem fala é uma amiga do Washington Novaes. Eu tenho um pedido dele para você”.
A coincidência me deixa confuso. Seria um trote? Ou teria ela recebido uma mensagem do além? A ligação não estava boa, e, enquanto eu tentava me recompor da surpresa, ela ia contando sua história. E eu doido pra interromper: “Afinal, o que ele quer?” Finalmente, ela diz: “Ele queria que você fizesse o prefácio de seu livro”.
Depois de uma troca de e-mails, ela mandou os originais. São excelentes crônicas de quem passou pelas redações de vários jornais, revistas e da televisão, onde ocupou cargos de chefia, inclusive no “Jornal Nacional”.
O capítulo que eu logo quis ler foi o da cobertura da “longa e estapafúrdia viagem ao redor do mundo”, realizada pelo folclórico general Costa e Silva como presidente da República. Me lembrava das gafes de quem era, segundo o anedotário citado por Washington, “uma mistura de inculto, grosseiro, ingênuo e violento”.
Há uma cena inesquecível descrita pelo jornalista: “Mãezinha (era assim que tratava a esposa na intimidade)”, disse ele contemplando o Rio Sena, “alguma vez na vida você imaginou estar comigo em Paris e eu presidente da República?”
Washington completa: “nem ela nem ninguém”.
E eu acrescento: nem nós podíamos imaginar que 53 anos depois iríamos ter uma cópia com menos patentes.