Cada flor jogada na água, cada pé molhado no mar é um gesto de esperança. Senão a multidão não cobriria as areias de Copacabana sussurrando desejos a Iemanjá. Fim de ano, fim de década.
Envolto em incertezas, nosso tempo é pobre em consolos e estruturas sólidas. A ciência e a tecnologia mudam a sociedade com mais rapidez do que as ideologias. Moldando estilos de vida, inauguram uma nova era. Na contramão do que é novo, por aqui pontifica uma ideologia caricata e delirante. O atraso cobriu o país de mofo em 2019. Um ano em que o ódio abriu suas asas mórbidas sobre nós.
O obscurantismo, como é de praxe, ameaçou artistas, intelectuais e jornalistas. Assustado com o mundo complexo que não cabe em seus limites estreitos rumina um sentimento de rancor. Sua palavra de ordem é, então, terra arrasada. Destruir tudo o que pensa e aponta para o futuro. Apagar o horizonte.
Longe desse cotidiano que nos asfixia, o mundo faz seu caminho de liberdades e riscos. As biotecnologias ampliam as fronteiras humanas ao mesmo tempo em que nos aproximam do impensável pós-humano. A internet dá acesso a toda a aventura do conhecimento. Paradoxal, permite também sua desconstrução e banaliza a mentira chamando-a de pós-verdade, enquanto manipula eleições. A genética propicia inesperadas configurações familiares. A inteligência artificial cria e rouba empregos. O robô segura a mão do idoso simulando o afeto que não tem.
Mulheres e jovens — estas imensas “maiorias globais” — defendem causas civilizatórias, combatem a violência de gênero e o aquecimento global. Esses movimentos são como a floresta que assombrou Macbeth: surpreendem o atraso com o sopro da mudança.
O mundo contemporâneo desafia o pensamento, o debate e as escolhas. Escolha é o outro nome da liberdade.
Obscurantistas se iludem, suas trevas não vieram para ficar. O futuro não espelhará submisso o presente. O tempo é um labirinto incerto onde os caminhos se bifurcam. É nessa brecha da incerteza que a esperança trabalha.