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E se o Brasil for campeão?

 

Se o Flamengo for campeão brasileiro, e a seleção campeã do mundo, até o Temer se reelege. A frase retumbante me foi dita pelo produtor Luis Carlos Barreto, flamenguista doente, que teme essa mistura de resultados. Não deveria, pois já é consabido que o futebol não dá voto a ninguém, embora os políticos cismem de se aproveitar dele. 

O próprio Temer tentou melhorar sua popularidade que está no chão fazendo uma gravação para a televisão completamente inócua sobre a Copa do Mundo, que começa hoje na Rússia para nós. Já Putin tira proveitos políticos da realização da Copa, que alimenta o sonho dos russos de voltarem a ser protagonistas no cenário mundial.

Para tanto, não precisam nem que a seleção de futebol vá muito longe, se passarem da fase de grupos já estão no lucro. Para uma autocracia que não passa de um simulacro de democracia representativa, Putin ter sido aplaudido em grande estilo no jogo inaugural da Copa foi um ganho político relevante, confirmação de que sua política de dar dimensão global a eventos que a Rússia protagoniza, pelo menos como organização, traz bons frutos na popularidade.

Não foi à toa que ele não foi vaiado, como a então presidente brasileira Dilma Rousseff na Copa de 2014. A favor do Brasil, somos uma democracia consolidada, e ninguém pensou em punir os que vaiaram a presidente, enquanto na Rússia de hoje vaiar Putin em público é um risco bastante grande.

Mas ninguém também foi obrigado a aplaudi-lo e a balançar a bandeira russa com orgulho. A autocracia de Putin não chega ao extremo da ditadura da Coréia do Norte, que obriga seus cidadãos a chorarem em público a morte do ditador da vez, como aconteceu quando morreu o pai de Kim Jong Un.

Até o presidente da FIFA, Gianni Infantino, teve seus quinze minutos de glória, aplaudido ao falar umas poucas palavras em russo. Ao contrario de seu antecessor, Joseph Blatter, que teve a infeliz ideia de dar uma bronca na torcida pela vaia em Dilma e também teve que se calar. Uma coincidência: tanto Dilma quanto Blatter perderam seus cargos depois da Copa de 2014.

Mas é estranho que no Brasil os resultados do futebol sirvam para eleger jogadores como o senador Romário ou o deputado Bebeto, mas não ajudem o presidente do turno. Mesmo na ditadura os governantes se dobraram à tentação de tentar tirar proveito da seleção. Médici, que gostava realmente de futebol, interferiu para que Dario fosse convocado, e Saldanha deixasse de ser o técnico do time vitorioso de 1970, e Geisel, que não gostava, tentou convencer Pelé a voltar à seleção em 1974.

Na redemocratização, nunca as vitórias ou derrotas da seleção influíram nos resultados eleitorais. Em 1994, o Plano Real teve muito mais a ver com a eleição de Fernando Henrique Cardoso do que a vitória nos Estados Unidos.

Em 1998, mesmo a seleção perdendo, o Plano Real voltou a ser o responsável pela reeleição. Em 2002, o time de Felipão trouxe o penta campeonato, com direito a cambalhota de Vampeta na rampa do Palácio do Planalto e beijo na taça de Fernando Henrique Cardoso, e mesmo assim o então candidato governista a presidente, José Serra, perdeu para Lula.

De lá para cá, nem mesmo a derrota em casa em 2014 , com humilhação dos 7 a 1 e tudo, impediu que a então presidente Dilma fosse vitoriosa. Lula se reelegeu em 2006 e elegeu Dilma em 2010, apesar das derrotas brasileiras.

O banco de investimentos Goldman Sachs todos os anos de Copa faz uma pesquisa global sobre as chances de cada seleção, e este ano o Brasil é o franco favorito pelas métricas adotadas. Tem jogadores talentosos, um bom balanço entre perdas e ganhos e o melhor índice Elo, que é uma medição utilizada em vários esportes, método estatístico para calcular a força relativa entre os jogadores, inventado pelo físico americano Arpad Elo para o jogo de xadrez.  

Os estudos da Goldman Sachs apontam uma final entre Brasil e Alemanha, com nossa vitória. Eles admitem, porem, que a graça do futebol é ser imprevisível, com elementos aleatórios que não podem ser colocados dentro de um programa de computação. Como se vê, até mesmo os algoritmos sabem que o Brasil é franco favorito, mas também sabem que o temor de Barretão é injustificável. Não há elementos estocásticos que façam Temer recuperar sua popularidade.

O Globo, 17/06/2018