O ódio sempre existiu, inclusive entre irmãos, como o de Caim contra Abel, relatado pela Bíblia como o primeiro homicídio da história da Humanidade. Mas esse sentimento nunca dispôs de um instrumento tão poderoso e rápido de disseminação quanto a internet agora. Segundo o historiador escocês Niall Ferguson, as redes sociais assumiram um papel tão importante e promoveram de tal maneira a radicalização das ideias e opiniões que essa polarização raivosa se transformou em “veneno”. Professor da Universidade de Stanford e estudioso da decadência do mundo ocidental, ele acredita que “os Estados Unidos chegaram a um nível de declínio que se tornaram uma sociedade não civilizada”.
Não sei se nós, brasileiros, estamos muito diferentes. A nosso favor, não temos um presidente que já acorda com a obsessão de transmitir para o país e o mundo sua dose diária de bílis diretamente do fígado. E faz isso por meio dos 140 caracteres do Twitter, ou seja, em mensagens instantâneas, recheadas de notícias falsas (as fake news) que se dirigem não à reflexão, mas ao reflexo, incitando os baixos instintos de quem recebe. O Prêmio Nobel José Saramago, pensando nessa tendência para o monossílabo como forma de comunicação, previa: “De degrau em degrau, vamos descendo até o grunhido”.
Felizmente, não temos um Donald Trump com seus grunhidos contra inimigos reais e inventados — o maluco da Coreia do Norte, os muçulmanos indiscriminadamente, os imigrantes em geral e os terroristas em particular. Mas vai ver que nós não precisamos — nós nos bastamos. O nosso ódio já foi contra os ditadores militares, hoje se volta contra nós mesmos. E parece que não é a sociologia que vai resolver isso, mas a psicoterapia, já que não é uma questão ideológica, mas de ego ferido por rancores vãos, carência, rejeição, falta de autoestima, intolerância com a diferença.
Enquanto Ferguson diagnosticou o ódio como um veneno que ataca a saúde — podendo afetar o sistema nervoso, a respiração, provocar desordem emocional — o terapeuta cognitivo-comportamental Juan Antonio Picasso, que também esteve recentemente no Brasil, para um seminário de Combate ao Estresse e à Ansiedade, receitou como antídoto o sentimento contrário: “O único elemento que dá paz e ordem a seu cérebro é o amor. É impossível não estar feliz se houver amor de boa qualidade”.
Portanto, iracundos das redes sociais, em vez do rancor, da raiva, do ressentimento e da ira, deixem o computador e façam amor — de preferência com humor.