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Aeroporto não é saída

 

Deve ser terrível para um governador e um prefeito ter sua administração reprovada pelos eleitores, como aconteceu agora com a pesquisa do instituto Datafolha. Ela revelou que 81% dos entrevistados, no caso de Pezão, e 40%, no caso de Crivella, consideram seus desempenhos ruins ou péssimos. E só 3% e 16%, respectivamente, aprovam os dois. O que não chega a ser novidade. O levantamento traduz em números a percepção geral manifestada em cartas dos leitores, redes sociais e em rodas de conversa. A surpresa, se há, é a reprovação relativamente baixa do prefeito, graças talvez à fidelidade que lhe devotam seus irmãos de fé.

Como eles reagiram ao resultado? Pezão foi mais sincero. Alegou que não será candidato e, portanto, não se preocupa com popularidade. “Não preciso disso. Só me preocupo com os salários dos funcionários e servidores”. Já Crivella divulgou nota em que não se refere diretamente à pesquisa do Datafolha, mas agradece a “generosidade da minha gente sofrida e valente (...) que com impagável paciência e bondade avaliou nosso governo nesses árduos meses de uma crise tão amarga”.

À insatisfação e à desconfiança do carioca com seus governantes se junta o medo — medo de ser assaltado, medo de sair à rua, medo dos bandidos e medo até da Polícia Militar. Segundo a pesquisa, 67% dos moradores a temem e só 31% confiam nela. O que eles mais temem? Das opções apresentadas no questionário, 49% disseram “bandidos”; 23%, “polícia”; e outros 23%, os dois, na mesma proporção. Só 2% responderam não temer nenhum deles. O temor da polícia chega a 28% entre os mais pobres (até dois salários mínimos de renda familiar mensal) e os mais jovens (16 a 24 anos).

E sobre a atuação das Forças Armadas no combate à violência? Segundo o Datafolha, 83% dos moradores do Rio são favoráveis e 15%, contrários. No entanto, quanto à eficácia, 52% dizem que a presença do Exército não alterou a realidade local, contra 44% que afirmaram ter melhorado, e 2%, que piorou. Qual seria a solução para esse triste estado de coisas? A resposta é o retrato da desesperança total. Nada menos que sete em dez habitantes do município, exatos 72%, só veem uma única saída: o aeroporto. Ou seja, iriam embora, se pudessem.

Não seria melhor, em vez de se mudar, ficar e ajudar a mudar o que deve ser mudado?

Pouco antes de completar 8 anos, no próximo dia 16, minha neta Alice comunicou aos pais que tinha sido “pedida em namoro” por um colega de colégio. E aceitou. Ainda bem que o rapaz é de boa família, sério e cavalheiro. Recebeu-a em casa com flores. Mesmo assim, ainda não sei se, como se dizia no meu tempo, faço gosto. Tenho que me refazer desse choque de modernidade.

O Globo, 11/10/2017