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Força-Tarefa no Rio

 

Os precedentes de sucesso no Acre e, sobretudo, no Espírito Santo, indicam que a criação de uma Força-Tarefa para combater o crime organizado, sem prazo determinado, com uma visão de longo prazo e sem estar atrelado a mandatos governamentais, é o melhor caminho para restabelecer a supremacia da lei no Estado do Rio.

A criação dessa força-tarefa, reunindo equipes do Ministério Público Federal, da Justiça Federal, da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal, para combater o estado paralelo criminoso que aqui se instalou, é a grande proposta feita pelo Ministro da Defesa, Raul Jungman, que depende da aceitação da nova Procuradora-Geral da República Raquel Dodge.

O diagnóstico das forças de segurança é de que o Estado foi capturado pela corrupção e pela criminalidade, ambos se cruzando. Temos cerca de 1 milhão de pessoas no Rio de Janeiro vivendo em um estado de exceção, sob o controle de bandidos, milicianos ou traficantes. Quem tem esse controle sobre o território, o que distingue no mau sentido o crime organizado no Rio de outros Estados da Federação, tem o controle político, é capaz de direcionar votos, de eleger seus representantes, fazer seus aliados, que se encontram na Câmara Municipal, na Assembleia Legislativa e mesmo no Congresso Nacional.

Num presidencialismo de coalizão como o nosso, distorcido em presidencialismo de cooptação, isso significa que esse pessoal é capaz de colocar os seus prepostos dentro do aparato de segurança. No Rio de Janeiro, alguém dessa ligação pode indicar um chefe de batalhão, um delegado, e assim por diante.

Essa prática, comum no Estado, foi interrompida durante certo período em que as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) estavam sendo instaladas, mas em algum momento a pressão política voltou, e a captura de postos chaves no aparato de segurança por indicações políticas acabou sendo uma realidade novamente no governo estadual, envolvido profundamente na corrupção e na proteção de quadrilhas.  

O Rio necessita de uma força-tarefa federal para dar conta, sobretudo, de um estado paralelo, classificado pelas análises dos serviços de informação como “capturado pelo crime organizado”. O projeto da Força–Tarefa baseia-se no que aconteceu no Acre e no Espírito Santo, estados que foram dominados por muitos anos por esquemas mafiosos que controlavam os três Poderes locais.

Hildebrando Pascoal, conhecido como o Deputado da Motosserra pela maneira como se livrava de suas vítimas, com requintes de crueldade, comandava a Polícia Militar do Estado do Acre e liderava um grupo de extermínio e o esquema de crime organizado para tráfico de drogas e roubo de cargas. Eleito deputado federal, em busca de imunidade parlamentar, foi condenado por tráfico, tentativa de homicídio e corrupção eleitoral a penas que, somadas, vão a cem anos.

No Espírito Santo, em 2002 o então governador José Ignácio, do PSDB, era chefiado pelo presidente da Assembleia Legislativa, deputado estadual José Carlos Gratz, bicheiro e líder do crime organizado no estado. No caso do Espírito Santo, o governador Paulo Hartung, quando eleito pela primeira vez em 2003, formou uma força-tarefa nacional, com forte atuação da Polícia Federal. Ao assumir, Paulo Hartung disse que herdava um estado “fora da lei”.

Naquela crise, um esquadrão da morte, segundo denúncias do Ministério Público, era formado por policiais, juízes, políticos, empresários, funcionários públicos e banqueiros do jogo do bicho.

Apoiando o governador recém-eleito, e em reação ao assassinato do advogado Marcelo Denadai, que elaborava um dossiê denunciando esquemas de fraudes em licitações no Espírito Santo, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pediu a intervenção federal, baseado na infiltração do crime organizado nos três Poderes estaduais.

A negativa do então Procurador-Geral da República, Geraldo Brindeiro, levou o ministro da Justiça Miguel Reale Júnior a pedir demissão do cargo. Na ocasião, o governo federal se decidiu, em vez da intervenção federal, pela criação de uma missão especial de combate ao crime organizado, formada por policiais federais, policiais rodoviários federais, delegados e procuradores federais.

O governador Paulo Hartung, mesmo desejando a intervenção federal e contrariado com o governo federal, aproveitou a criação da força-tarefa para a recaptura do Estado das mãos das quadrilhas organizadas que, como no Rio hoje, atuavam com a cobertura das autoridades estaduais de todos os níveis.

Foi um marco no combate ao crime organizado no país. É o que se pretende no Rio, e o exemplo leva até mesmo a que grupos pensem em lançar o mesmo Paulo Hartung, governando o Espírito Santo pela terceira vez, ao governo do Rio em 2018.

O Globo, 26/09/2017