O Ministério Público Federal está empenhado nos últimos dias em encontrar na legislação de direito civil brasileira meios de retirar da família Batista o controle das empresas do grupo J&F, a partir da decisão de rescindir o acordo de colaboração premiada firmado com Joesley Batista.
Revendo os benefícios concedidos, a Procuradoria-Geral da República vai pedir a prisão dos irmãos Batista e dos assessores que fizeram a delação premiada, agora maculada por omissões graves.
Os bens de todos os envolvidos serão colocados em indisponibilidade e, com base na legislação que protege os acionistas e os empregos das empresas do grupo J&F, elas serão acusadas de lavagem de dinheiro, e de ganho de capitais ilícitos a partir da delação premiada contra o presidente da República.
A questão do controle das empresas do grupo é delicada e está provocando muitas discussões internas, já que qualquer medida seria baseada em situações em que a legislação prevê uma intervenção na administração de empresas, sejam concessionárias de serviço público ou bancos.
Fazer um tipo de controle das empresas privadas com base em uma criatividade legal que use interpretação alargada de instrumentos do direito civil é certamente um passo controverso.
Todos esses detalhes serão analisados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), pois o pedido de rescisão será encaminhado ao ministro Luiz Facchin, responsável no Supremo pelo processo de delação premiada de Joesley Batista e assessores, que pode decidir monocraticamente ou levar para o plenário do Supremo.
Como esclarece Cosmo Ferreira, advogado criminal e ex-promotor de Justiça do Rio e procurador regional da República, não se trata de anulação, mas de rescisão. A nulidade e a anulabilidade são sanções impostas aos atos jurídicos, como o acordo de colaboração, que afrontam a lei. Seria o caso de uma colaboração tirada à fórceps.
Já a rescisão ocorre quando uma das partes não cumpre a prestação a que se obrigara. Se o Joesley não cumpriu o acordado, as provas podem ser utilizadas, inclusive em seu desfavor. Ainda que se entenda que a gravação da conversa é ilícita, as demais provas não o são, pois não há entre elas relação de causa e efeito, não tendo aplicação a teoria dos frutos da árvore envenenada.
Já Sonia Rabello ex- procuradora do município do Rio, explica que a rescisão é baseada em fatos novos que apareçam, e trazem modificações da situação fática na qual foi feito o ajuste entre as partes.
Estas novas informações podem suscitar “um desfazimento do ajuste feito”. A rescisão produz efeitos para o futuro, e não para o passado, não afetando, portanto, as provas coletadas.
O advogado de Temer, Claudio Mariz, vai pedir a anulação da colaboração premiada na premissa de que ela foi feita sob orientação do então procurador Marcelo Miller, que trabalhava na equipe de Rodrigo Janot. Não há, no entanto, nenhuma indicação de que Janot soubesse das tratativas de Marcelo Miller com Joesley Batista e, segundo a Procuradoria-Geral da República, não havia, até o momento da entrega dos áudios, nenhuma negociação com o grupo J&F em torno de uma colaboração premiada.
Nas conversas agora reveladas fica claro que Joesley e seus assessores não tinham contato com Rodrigo Janot enquanto negociavam com Marcelo Miller, que, até onde se sabe, fazia um trabalho duplo por conta própria.
Essa discussão será travada no plenário do STF, onde há ministros como Gilmar Mendes que consideram que a gravação do presidente Temer foi feita através de uma ação controlada não autorizada pela Justiça, e, portanto, é prova inválida, e outros que consideram que os fatos apontados demonstram que houve deliberada omissão por parte dos delatores, que, no entanto, não invalidam as provas coletadas.