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Infraestrutura defasada

 

Com as privatizações de volta ao debate político-econômico, um trabalho de Cláudio Frischtak daInter.B Consultoria Internacional de Negócios para o IPEA esclarece a situação da infraestrutura brasileira e indica as razões pelas quais torna-se necessário privatizaras empresas e os ativos de infraestrutura do país, inclusive, ressalta o economista, o fato de o Estado brasileiro – imerso na maior crise fiscal da República - não ser mais capaz de responder às necessidades de investimento.

Outra razão básica é má alocação de capital por conta da captura de órgãos e empresas públicas por grupos de interesses, tanto políticos quanto econômicos. Agora mesmo em sua caravana pelo nordeste, o ex-presidente Lula teve a coragem de ir à Refinaria Abreu e Lima para defender o investimento feito em conjunto com o governo chavista venezuelano.

Hugo Chaves não colocou um mísero centavo na obra que seria conjunta, que já custa quase 10 vezes mais do que o previsto, e não se justifica em termos econômicos. O IPEA, no contexto do projeto Desafios da Nação, pediu à consultoria de Claudio Frischtak para calcular o estoque de capital em infraestrutura no país, e qual seria um estoque-alvo que refletisse uma infraestrutura modernizada, e quantos anos seriam necessários para atingirmos esse alvo em função do que investiríamos no setor.

Os quatro grandes setores de infraestrutura -  transportes, energia elétrica, saneamento e telecom – foram analisados, e o resultado é que estamos particularmente atrasados em saneamento e transportes; e mais próximos da fronteira em telecomunicações (privatizados há duas décadas). No agregado, a estimativa central de estoque de capital em infraestrutura é de 36,1% do PIB em 2016, quando o alvo deve ser 60,4% do PIB.

Segundo o economista ClaudioFrischtak, se começássemos esse ano de 2017, e investindo mais do que duas vezes o que o fizemos em 2001-16 (ou seja, 4,15% versus 2,02%), levaríamos 20 anos para atingirmos o objetivo de modernização. Se continuarmos a investir o que vimos investindo, literalmente nunca modernizaremos a infraestrutura do país, afirma o economista.

O trabalho fez também um cálculo do impacto do sobrepreço nas obras públicas sobre o estoque de capital, que pode ter representado uma redução de até 4,6% do PIB no estoque, “uma medida bastante dramática do custo da corrupção”. Mas uma correção de rumos, nesse aspecto, pode ao longo dos anos diluir o impacto, ressalvaFrischtak, que vê nessa possibilidade “mais uma razão premente para mudarmos as práticas deletérias que permeiam o sistema político e o Estado”.  

Em síntese, diz ele, rótulos e ideologias à parte, mobilizar recursos, agentes e investimento privados (inclusive e particularmente pelas privatizações) é a única forma de atualizarmos a infraestrutura do país – essencial para a competitividade da economia e o bem estar da população. 

O setor mais distante do estoque-alvo é o de transportes, que precisa mais do que duplicar o estoque de capital (para 26,5% do PIB), o que demandaria praticamente triplicar os investimentos feitos nos últimos anos, investindo-se quase 1,29% do PIB a mais do que já se investe para alcançar a meta em 20 anos.

 Dos 2,1 pontos de PIB necessários a mais por ano para modernizar a infraestrutura do país nesse horizonte temporal, o setor absorveria 61%. Em suma, os maiores desafios em termos relativos e absolutos estão concentrados em infraestrutura de transportes.

Já saneamento é o segundo maior desafio em termos relativos, demandando investimentos duas vezes e meia maiores do que a média do milênio. Em energia elétrica haveria necessidade de um grande esforço em termos absolutos: investir em média 1,05% do produto ao ano, um incremento anual de 0,43 pontos de PIB.

Finalmente, o setor de telecomunicações é aquele mais próximo de alcançar o estoque alvo em vinte anos, bastando expandir em 0,14% do PIB ou 24% os investimentos anuais em relação à média 2000-16.

Entretanto, o trabalho da consultoria chama a atenção para o fato de que os investimentos em telecomunicações têm caído gradualmente nos últimos anos, possivelmente por conta das baixas taxas de retorno de capital investido (estimadas em 4,8%, significativamente menores do que o custo de capital).

Atingir o estoque alvo nos anos estimados supõe uma execução eficiente dos investimentos ao longo dos anos – diferentemente do observado nas últimas décadas – e um reequilíbrio na sua alocação intrasetorial em muitos casos (a exemplo de transportes).

Nesse sentido, diz o estudo, a modernização da infraestrutura no país e a oferta de melhores serviços irá requerer uma nova governança pública dos investimentos, com o reforço no âmbito técnico dos processos de planejamento, e maior autonomia decisória e financeira das agências, “cujo fortalecimento é fundamental para reduzir a insegurança jurídica e a incerteza regulatória que afasta os investimentos privados, essenciais para a modernização da infraestrutura do país nas próximas décadas”.

O Globo, 26/08/2017