Sr. Carlos Castelo Branco,
foi o nosso Presidente Austregésilo de Athayde, essa extraordinária figura de homem, intelectual de soberba estirpe, quem imaginou que as noites de posse na Academia não seriam assistidas somente pelos vivos.
No meio da Casa, flutuando nos espaços, entre damas e cavalheiros, diplomatas e escritores, dignitários do Estado e das igrejas, estavam os nossos antecessores, no esplendor da morte, de fardão dourado, atentos, concentrados e jubilosos, na glória de uma presença eterna que se repetiria nestes instantes, como “objeto do nosso culto, honra da nossa existência, guarda e proteção dos nossos ideais”, sentinelas das nossas tradições.
Nasceria dessa comunhão do passado com o presente, da vida com a morte, a sagrada existência da nossa imortalidade. É que, nós todos, somados, menores que a Academia somos. Por isso mesmo, este momento tem sempre um significado transcendental.
A minha escolha para saudar-vos, Sr. Carlos Castelo Branco, abrindo os louvores da chegada, é uma fraqueza do vosso coração, tocado por velha amizade, pela faina comum da Política, pela vida mesmo, em dias e afeições que se confundem e se completam no gosto da convivência.
Viemos das mesmas terras, de história e geografia comuns, de costumes e destinos semelhantes, de gemidos e cantos entoados pelas mesmas bocas sedentas e sofridas, pelos mesmos olhos amarelados da pobreza e da imensidão dos infortúnios.
João Neves da Fontoura advertia que o discurso acadêmico de recepção não era fácil. Manda a tradição que o louvor não seja total e que “aqui e ali as pontas de alguns alfinetes resvalem, de leve”.
Quebrarei a tradição acadêmica, porque as minhas palavras serão como aquelas cantigas de São Gonçalo, dos alegres bailes dos sertões do Gurgeia e de Jerumenha:
Batateira quando nasce
bota rama pra baía
onde tem rapaz solteiro
casado não tem valia.
Venho nuvem do Levante
pra nesta festa louvar
São Gonçalo do Amarante
padroeiro do dançar.
Assim, minha missão será louvar, somente louvar, Sr. Carlos Castelo Branco, e vós o mereceis.
UMA AGULHA ENFERRUJADA
Uma única farpa poderia lançar-vos, lembrando o vosso livro Os Militares no Poder. Mas seria uma agulha enferrujada, aquela mesma que Sousa Bandeira, ao receber Félix Pacheco, endereçou-lhe, aludindo à sua “inaptidão pessoal para a carreira das armas” e o contraste de vê-lo metido no uniforme acadêmico, bordado a ouro, e de espada embainhada: “Quanto à farda, contentai-vos com a que hoje trazeis e que, valha a verdade, vos fica muito bem.”
CADEIRA RICA
Ocupais uma Cadeira rica que pertenceu a Pereira da Silva, Rio Branco, Lauro Müller, D. Aquino Correia, tendo como Patrono Sousa Caldas. Sucedeis a uma das presenças mais constantes na vida intelectual do País das últimas décadas, Raimundo Magalhães Júnior, escritor de variados gêneros, de obra vastíssima em todos os campos. Nele é difícil destacar – como acentuou Viriato Correia – qual a faceta melhor, a não ser um campo comum, sedutor e impressionante: o trabalhador das Letras.
Na Rua da Glória, esquina do Mercado, nascestes, na Chapada do Corisco, para onde o conselheiro Saraiva, quando governou a Província do Piauí, levou a Capital, dando-lhe o nome de Teresina – composição de Teresa e Cristina, homenagem à Imperatriz.
A duzentos metros da casa do Desembargador Cristino Castelo Branco, pai e mestre, corre o Rio Parnaíba, rio cantado em prosa e verso, por gerações e gerações de intelectuais da vossa terra, desde Da Costa e Silva, que o eternizou no verso do “Velho Monge de Barbas Brancas Alongado”, até os nossos tempos, como no romance de Assis Brasil, Beira Rio Beira Vida, como no Margem Rio Mundo, de Álvaro Pacheco, dos melhores poetas de sua geração, a dizer, na evocação das lavadeiras:
Bate roupa, bate sol
bate fome, bate peitos
bate carne descarnada
na pedra, no quarador.
É que o Parnaíba exerce o fascínio e o encantamento das águas. O mesmo encantamento e fascínio que invadiu Odylo Costa, filho, maranhense com um lado do coração no Piauí, ao escrever A Faca e o Rio. O rio da novela é o Parnaíba. De Deolindo Couto, não conheço nenhuma confissão pública de amor ao Parnaíba, mas não tenho dúvida de que, às escondidas, deve ser a mesma paixão dos piauienses.
O Parnaíba é um rio que tem ares de avô, já nasceu velho, é vacilante no passo, cuidadoso no andar, olhos cansados de olhar as margens dos maranhões e dos piauís, onde mais aproxima do que separa, desde as nascentes do Boi Morto e do Água Quente, ao pé da Serra da Tabatinga.
Uma noite de estrelas, numa canoa de remos, vi o delta do Parnaíba, onde ele, para não se entregar de uma vez na boca do oceano, parte-se em braços, de Tutoia, Carrapato, Igaraçu, Canárias e Caju. Aí, se enrola em bancos de uma areia alva, que brilha e foge, esconde-se em igarapés, pequenos riachos, lagoas e charcos. E, não satisfeito, inunda os campos planos fugidios, onde resplandece dominante a carnaúba, esguia, altiva, árida.
Foi nesse instante que confirmei a vocação piauiense do Parnaíba e compreendi a magia que ele exerce. E uma correspondência: na hora de morrer, é em terras do Piauí que ele mais se enrosca, se encurva, se deita.
A CAMINHADA
No Liceu Piauiense, fundado pelo Conselheiro Zacarias de Góes e Vasconcellos, começastes os estudos. Ouvindo o pai recitar Alberto de Oliveira, Da Costa e Silva – de quem recolheu o soneto “Saudade” – Cruz e Sousa e Gonçalves Dias, lendo Eça, Humberto de Campos, Herculano e Camilo, sentistes o despertar da vocação literária. Era mais um da família a ingressar na dinastia da inteligência piauiense, em que figuram tantos, desde Leonardo de Nossa Senhora das Dores, passando por Teodoro, Hermínio, Deolindo Cristino, até Carlos, todos Castelo Branco. O ambiente da casa sempre foi o da convivência literária. Os parentes Clodoaldo e Lucídio Freitas pertencem, ao lado de Fenelon Castelo Branco, Anísio de Abreu, Joaquim Ribeiro Gonçalves, Baurélio Mangabeira, Higino Cunha e tantos outros, à chamada geração de ouro, que trouxe de Pernambuco a poesia nova, divulgaram Filosofia e incentivaram um grande movimento cultural no Estado, que desembocou na fundação da Academia. Cristino Castelo Branco, vosso pai, continuaria a obra dos parentes Freitas e, com Martins Napoleão, José Auto de Abreu, Artur Passos, Edson Cunha e outros continuaria aquilo que Herculano de Morais chamou “uma fase pródiga da literatura piauiense”.
O Piauí, perdoem-me a digressão, é um Estado singular. Em qualquer lugar do mundo, o Poder, nas revoluções, se toma pela força. Pois no Piauí ele é assaltado pela Poesia. Gabriel Luís Ferreira, segundo a tradição popular, recita para o povo as estrofes condoreiras do poema a “Pátria Livre” e com elas vai ao Governo do Estado, na Proclamação da República.
AS MINAS GERAIS
Moço, em vossa terra fizestes, aos quatorze anos, o primeiro jornal. Tanta precocidade induzia a família a mandar-vos estudar nos grandes centros. O Rio de Janeiro, sem dúvida, seria o destino natural. Mas aconselharam vosso pai a pensar em lugar mais protegido, bom clima, cidade sanatório, de bom nível cultural e sem os riscos da perdição, que diziam existir em cada enseada da Baía de Guanabara. Belo Horizonte, de costumes severos, foi a escolhida, e para lá fostes.
Otto Lara Resende assim vos descreve, na lembrança desses tempos: “De pequena estatura, cara oblonga de piauiense recheado de silêncio, o Carlos Castelo Branco dos tempos iniciais de Belo Horizonte, quando lá chegou, pouco tem a ver, aparentemente, com o homem desenvolto e o ágil colunista político de hoje.” E conclui: “O tempo tornou-o mais jovem: desatou-lhe a língua.”
Para vossa formação política, a passagem por Minas Gerais é definitiva. No Piauí era a Literatura o tema de todas as horas, em Minas é a Política. Daí, confessais, consolidastes a vocação liberal de vosso espírito. Há nessa etapa, a presença de um mestre.
O que mais vos seduziu, o que mais vos encantou e escravizou pelo tempo afora, Artur Versiani Veloso, professor de História da Filosofia que vos ensinou a ler, a ler um sistema e saber o que estava lendo. Esse homem, primo do nosso confrade Cyro dos Anjos, expoente dessas luzes da inteligência e do espírito de Minas Gerais.
Mas a perdição estava no vosso caminho e vós a encontrastes. Foi mesmo em Minas Gerais, aos 18 anos, o ingresso na carreira de jornalista, e, para começar, repórter de polícia. Mas os acontecimentos políticos são confundidos, por vezes, com os fatos policiais. Já foi dito que a Queda da Bastilha, em 1789, foi narrada como um acontecimento policial.
Rapidamente, galgastes promoções, sendo presença constante, a partir desse momento, como repórter, redator, editorialista, secretário, chefe de redação, colunista em A Noite, O Jornal, Diário da Noite, Diário Carioca, Mundo Ilustrado, O Cruzeiro, Tribuna de Imprensa, Folha de S. Paulo, até chegardes ao quase centenário Jornal do Brasil, tradicional órgão que honra a Imprensa Brasileira, onde há mais de vinte anos, diariamente, sois a figura solar do Jornalismo Político do País.
UM SIMPLES REPÓRTER
Os jornalistas que chegam à Academia fazem-no com a humildade de uma contribuição menor do Jornalismo ao mundo das Letras. Vós não sois exceção e, humildemente, vos declarais “um simples repórter”.
Assis Chateaubriand se apresentou como “gerente de jornais e revistas”, Elmano Cardim e Félix Pacheco, como “homens de imprensa”. Afrânio Peixoto contestou essa modéstia em plena sessão solene nesta Casa e acentuou que “a Imprensa sempre trouxe acadêmicos” e, para concluir, desejoso de estimular uma candidatura, acrescentou: “Não vejo ninguém do Jornal do Commercio.”
Na mesma linha, Aníbal Freire, ao receber Assis Chateaubriand afirma que “a Academia Brasileira de Letras sagrou o jornalista” e que “a nossa Instituição sempre teve o fascínio pelos líderes da imprensa”. Essa predileção nos vem dos fundadores. Rui ao escolher o seu Patrono, escolheu a Evaristo da Veiga, Sílvio Romero a Hipólito da Costa, José do Patrocínio a Joaquim Serra. Entre os nossos fundadores não estavam também Alcindo Guanabara, Medeiros e Albuquerque e Carlos de Laet?
André Siegfried dizia que aprendeu mais “com as viagens e com a conversação do que com as leituras. Meu método é o de um repórter”, confessava. Félix Pacheco comentava que “no jornal as pessoas vão se polindo na banalidade do noticiário e sentindo de perto as crepitações da vida comum” – para concluir: “Quanto repórter não subiu daí a escadaria do sonho.”
Levi Carneiro, no discurso de recepção a Elmano Cardim, afirmava que os méritos do empossado eram apenas de jornalista e bastavam: “De vós não conheço uma só poesia, nem uma só página de ficção” – disse-lhe.
Porém de vós, Sr. Carlos Castelo Branco, não podemos dizer a mesma coisa. Ao lado do jornalista, está o ficcionista consagrado dos Continhos Brasileiros e do Arco do Triunfo que mereceram da crítica elogios e reconhecimento.
Manuel Bandeira diz, ao escrever sobre o Arco do Triunfo:
Castelo é, no consenso de todos os homens de imprensa do Brasil, o nosso melhor observador e cronista. No Arco do Triunfo, a trama do romance é desenhada com aquela firmeza de traço em que não há linha morta, e até as personagens episódicas vivem intensamente. Castelo, esse grande prosador, é também grande romancista.
Jorge Amado não resistiu à prova de fogo da leitura de livro, aquilo que ele chama “sua capacidade de arrastar o leitor”, e confessa: “Arco do Triunfo é um desses livros que a gente lê avidamente, e, uma vez iniciada a leitura, não se interrompe. Ninguém, no entanto, após ler Arco do Triunfo, pode honradamente discutir as qualidades de escritor e de romancista de Carlos Castelo Branco.”
O livro aborda um tema político, narrando a história de um homem que se degrada, na ambição do sucesso. Carlos Lacerda, que leu duas vezes a obra e escreveu sobre ela dois artigos críticos, vê no romance uma transposição de tipos, acha o livro cruel, mas reconhece que “Carlos Castelo Branco tem uma insistente vocação para a literatura de ficção”. Adolfo Casais Monteiro, o grande crítico português, estudando o romance, afirma que “o livro foi feito por mão de mestre”.
Mas a verdade é que entrais na Academia como jornalista, dos maiores de nossa história, na galeria dos grandes escritores, dos que mais prestaram serviços ao País, pela coerência, pelas convicções.
A Casa acaba de ouvir a vossa primorosa oração de posse, sequência do vosso estilo direto, da palavra leve, da frase sem morada para adjetivos, do cuidado para com a Língua. Quem vos conhece sabe que esta noite deve ser uma das maiores emoções que tendes vivido. E vosso coração já sofreu tantas emoções, desde as mais singelas até o limite amargo do punhal do destino.
Na evolução do Jornalismo Brasileiro, reconheço aquilo que Pompeu de Sousa, o nosso grande Pompeu, pai e mestre de tantos jornais e jornalistas, afirma terdes herdado, ou seja: a pena com que José Eduardo de Macedo Soares, por quase meio século, debateu os problemas políticos nacionais. Ele, por sua vez, havia sucedido a Alcindo Guanabara. Porque há toda uma genealogia do comentário político brasileiro, que vem de Evaristo da Veiga, Clemente Pereira, José Bonifácio, José do Patrocínio, Joaquim Serra e Quintino Bocaiúva, para resplandecer na vossa pena, no momento atual da vida brasileira.
O Jornalismo é, muitas vezes, para o puro homem de Letras, uma atividade paralela, que ele comparte com a Poesia, o Romance, o Ensaio Crítico, o Teatro. O vosso antecessor foi o bom exemplo desse tipo de atividade diversificada, embora tenhamos de assinalar que, no seu caso, o Jornalismo foi a atividade dominante, que influenciou as demais. Daí o poder de comunicação de seu estilo.
Nosso Patrono, Machado de Assis, foi também jornalista, na sua condição de cronista constante, como Josué Montello, o nosso inexcedível Josué, atento ao que se passava no mundo ou à sua volta e que merecesse o comentário da sua pena. Assim Félix Pacheco, jornalista e piauiense como vós, assim Constâncio Alves, assim Carlos de Laet, assim Aníbal Freire, assim Assis Chateaubriand, assim Múcio Leão, assim Álvaro Lins, assim Austregésilo, assim Alceu Amoroso Lima, assim Barbosa Lima Sobrinho, assim Francisco de Assis Barbosa, assim Otto Lara Resende, assim Adonias Filho, assim Afrânio Coutinho, assim Rachel de Queiroz, assim Dinah Silveira de Queiroz, assim D. Marcos Barbosa.
No vosso caso, Sr. Carlos Castelo Branco, o Jornalismo, além de ser a atividade dominante, tem uma feição especial, a do Jornalismo Político. E que é o Jornalismo Político? É o político que fez do Jornalismo a sua tribuna. Em vez de vos orientardes no sentido da tribuna parlamentar, tendestes para a tribuna do jornal e ali exerceis uma tão grande influência, que se pode dizer, sem lisonja nem perigo de erro, que sois um dos líderes do pensamento político do Brasil neste momento.
Vossa presença no Jornal do Brasil é mais do que um espelho da atualidade. É um processo de consciência da própria Política Nacional. Porque não vos limitais à condição de expositor dos acontecimentos: sabeis ser o pensador e o teorizador, com a capacidade de ver, de intuir e de concluir.
E isso decorre de dois fatores importantes: de um lado, a vossa capacidade de apreensão; de outro lado, a vossa extraordinária experiência dos homens e dos acontecimentos. Trouxestes, da solidão dos campos do Piauí e das montanhas de Minas, o gosto de ouvir a Natureza, que vos talhou para escutar. Tende o ar de quem está sempre atento ao que ides ouvir, mesmo quando interferis no diálogo. Sempre o fazeis de tal modo, que o vosso interlocutor costuma dizer-vos mais do que intimamente pretendia. Sócrates chegava à verdade pela Maiêutica; vós adotais um processo mais simples, que consiste num simples hum hum, dito de passagem à boa maneira piauiense e maranhense, e que puxa pela palavra alheia com singular habilidade e eficácia.
Em toda murmuração política, há fantasia e verdade. Já se disse que a Política é uma mistura de realidade e sonho. Por vezes, a fantasia é mais verossímil, com todas as aparências da verdade, enquanto a verdade muitas vezes parece fantasia. Só uma coisa imita o inusitado e o imprevisível na Política: a vida. Sabeis discernir uma e outra, como se ambas passassem por um exame de laboratório, capaz de detectar o fato real e o simples boato.
Já se definiu a missão do jornalista, no plano do Jornalismo opinativo, como poder de transformar a opinião pessoal em opinião pública, por intermédio do jornal. Esse poder continua a existir no jornal impresso, a despeito da competição exercida por meios mais modernos de comunicação de massa, como o rádio e a televisão. Mas o jornal impresso é ainda o instrumento reflexivo por excelência.
Os meios da moderna tecnologia colocada a serviço do fazer jornal vieram ajudar a difusão da mais importante liberdade, asseguradora de todas as outras liberdades, que é a liberdade de imprensa. Quando esta entra em colapso, todas as outras liberdades desaparecem. O poder de questionar governos, políticas, atitudes e comportamentos – básico nas democracias – só se torna efetivo com Imprensa livre.
Digo isto, Sr. Carlos Castelo Branco, para acentuar a singular importância de vossa presença na história do Jornalismo Brasileiro. Cito um exemplo:
Quando o Congresso esteve fechado, declarado em recesso, Carlos Castelo Branco, esquecendo a censura, não deixou passar um só dia sem falar do Congresso, anunciando sua volta, dizendo da sua importância como a maior das instituições liberais e substituindo o silêncio das tribunas parlamentares pela inteligência de sua tribuna jornalística. O Poder Legislativo tem para com esse jornalista, ainda não resgatada, uma grande dívida.
Ele foi o Congresso quanto o Congresso não era.
Seu comportamento ético, sua firmeza de princípios, a retidão de sua conduta, compõe a personalidade do grande escritor, que, para defender suas convicções democráticas, provou a polpa amarga da prisão. Sua integridade moral é absoluta.
Quando trabalhava em determinado órgão, o proprietário da empresa deu-lhe as instruções para fazer o Editorial: “O jornal, Castelo, é um moleque que exige o sacrifício diário de uma reputação. Você ataque a quem quiser, contanto que ataque uma pessoa a cada dia.”
Em seguida, perguntou ao jovem empregado que se sentava à máquina: “A quem você vai atacar?”
Castelo respondeu: “Ao Senhor!”
Sois um referencial. Marcais uma época. Tivemos o tempo do panfleto, da linguagem de fogo queimando reputações e pessoas, derrubando gigantes e poderosos. É o “Timandro”, de Torres Homem, é um Thomas Payne com o seu temerário e audaz Common Sense. Tivemos o Jornalismo doutrinário, a serviço de uma causa. Era a hora de Patrocínio, de Bocaiúva e Guanabara, de Macedo Soares e Lacerda...
Temos hoje o Jornalismo de análise. Nele o fato político é dissecado com precisão e frieza de cirurgião. Todos os ângulos são examinados sem a paixão do panfletário nem o arrebatamento e o comprometimento do ativista. Existe a informação para ser trabalhada, analisada em correlação com outros fatos presentes, dos quais devem ser retiradas ilações de consequências futuras.
Esta fase é vossa. Sois a figura inaugural, no legado que conseguistes acumular ao longo de tantos anos, no amassar diário do barro da informação política. O acervo desse trabalho, indispensável ao estudo da História Brasileira Contemporânea, impresso, comporá dezenas de volumes.
Evandro Carlos Andrade, brilhante expoente da atual geração de jornalistas do País, traz o testemunho dos novos, ao declarar que sois “o melhor repórter político que já houve e que há”.
Passastes por Minas, onde aprimorastes a solidão e a nostalgia de vossa terra.
Aqui chegais, e convosco vem o Piauí. Pelo berço e pela geografia. Pela presença ausente de Cristino Castelo Branco que amava a Academia e que morreu sem ver as luzes desta noite.
Vem também com Leonardo de Nossa Senhora das Dores Castelo Branco; o primeiro, o poeta cósmico, valente guerreiro das lutas pela liberdade, no verso de Dobal:
“Cantos de queimadas, dos currais de pedra do homem e de outros bichos esquecidos nos campos de cinza e da cinza do Piauí onde se enterram.”
Sede bem-vindo!
A Academia está honrada e jubilosa com a vossa presença.
25/5/1983