"Não sou ministro. Estou ministro." A frase, pronunciada pelo então ministro da Educação, em sua simplicidade radical, ficou sendo uma das melhores expressões do velhíssimo problema que tenta definir a relação do intelectual com o poder. Pronunciou-a em causa própria Eduardo Portella, que aceitara o cargo num momento em que o fim da ditadura e a abertura política eram consideradas iminentes.
O tema (cultura e poder) frequenta sua obra de ensaísta e crítico de literatura. Um de seus livros, publicado pela Tempo Brasileiro, editora de sucesso que fundou, tem o título de "O Intelectual e o Poder".
Nele, o ensaio "O Renascimento da Utopia" desenvolve magistralmente aquela frase pronunciada num momento de sua biografia: "E daí também a necessidade de o intelectual guardar, como arma não tão secreta, o trunfo da insubmissão. A alternativa da insubordinação deve recuperar o ser do estar. Até porque nós só temos o que podemos perder, o que não podemos perder nos tem".
Baiano, formado em Recife, onde conviveu com Gilberto Freyre, Portella fez estudos na Espanha, quando foi aluno de Dámaso Alonso e Carlos Bousoño. Mais tarde, na Itália, onde recebeu aulas de Ungaretti e de Bataillon, no Collège de France e na Sorbonne, tornando-se, assim, o crítico mais bem equipado de sua geração. Portella construiu sólida reputação não apenas na crítica da literatura, mas nos assuntos brasileiros em geral.
A série que escreveu, "Dimensões", é um dos momentos mais nobres e fecundos de nossa história literária.
Sua morte nesta semana desfalcou a nossa cultura, a Academia Brasileira de Letras, e eu perdi um amigo que muito me ensinou e que nunca esquecerei.
Foi um "gentleman" em todos os sentidos e honrou o nosso tempo com o seu exemplo e o legado que nos deixou.