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Será que sobra alguém?

 

Os que torcem ou agem contra a Lava-Jato, aberta ou sub-repticiamente, vão ter que usar como pretexto não mais aquele que atribui ao juiz Sérgio Moro uma suposta parcialidade que o faria descobrir corruptos apenas nos arraiais petistas. “Onde estão os tucanos?”. Li e ouvi muito essa cobrança. “Só os petistas receberam dinheiro ilícito?”. Não adiantava argumentar que as investigações não estavam concluídas e que era melhor aguardar, por exemplo, as delações dos 77 executivos (e ex) da Odebrecht. Os adeptos mais radicais da teoria conspiratória chegavam a insinuar que o juiz de Curitiba fora escolhido a dedo para incriminar Lula e impedir sua pretendida volta. Não levavam em consideração o fato de que as decisões de Moro, em sua esmagadora maioria, tinham sido mantidas pelas cortes superiores.

A resposta à recorrente pergunta veio de onde se esperava — dos cerca de 900 depoimentos oferecidos em forma de um prato farto e variado ao procurador-geral Rodrigo Janot para as devidas providências. Há de tudo e de todos, inclusive tucanos. Da lista que chegou a Janot, constam ministros do presidente Temer (Eliseu Padilha e Moreira Franco), os suspeitos de sempre (Romero Jucá, Renan Calheiros, Eunício Oliveira, Edison Lobão) e, representando a tão aguardada presença do PSDB, os também senadores Aécio Neves e José Serra. O primeiro é acusado de estar ligado a um esquema de propina e o segundo, de ter recebido R$ 23 milhões de caixa dois na disputa de 2010. Ao TSE, Marcelo Odebrecht revelou ter repassado R$ 15 milhões à campanha de Aécio, que, segundo outro delator da empreiteira, teria pedido e conseguido mais R$ 9 milhões para o PSDB.

Impressionado com as revelações que estão surgindo da Lava-Jato e das investigações no TSE da chapa Dilma-Temer, o ministro do STF e presidente do TSE, Gilmar Mendes, propõe uma reforma do sistema político-partidário já para o próximo pleito. Conhecendo o volume e o valor dos recursos desviados, ele calcula que o dinheiro ilegal injetado na eleição de 2014 pode ter superado as doações legais. “Talvez o caixa dois tenha sido mais forte do que o caixa um”.

De fato, quando se imagina o que a Lava-Jato ainda nos reserva, a pergunta é inevitável, mesmo que exagerada: será que vai sobrar alguém em pé?

Não há filigrana jurídica capaz de convencer o bom senso de que foi justa a decisão de mandar soltar, ainda que provisoriamente, o goleiro Bruno após cumprir apenas seis anos e sete meses dos 22 a que foi condenado pelo assassinato e ocultação de cadáver de sua ex-namorada Eliza Samúdio, sem sequer revelar onde foi enterrado o corpo da mãe de seu filho.

O Globo, 08/03/2017