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Cresce o ensino técnico

 

Medida provisória não é o ideal para reformar a educação, mas, se fôssemos esperar por uma ação legislativa, teríamos que aguardar muito tempo. Foi o que levou o presidente Michel Temer a assinar a MP de 23 de setembro, graças a Deus escoimada das restrições iniciais a quatro disciplinas que não deveriam ser cortadas do currículo: artes, educação física, sociologia e filosofia. 

Valorizando português, matemática e inglês, o novo instrumento legal deixa entreaberta a porta para outras matérias essenciais, como robótica, criação literária e software. É sinal dos novos tempos que vêm por aí, caracterizando a necessária flexibilização de que tanto se fala. O aluno, a partir do ano letivo de 2018, passará a dispor de uma oferta mais inteligente de currículo. Espera-se que tais correções aconteçam na discussão definitiva da Base Nacional Curricular Comum (BNCC) — e que isso venha com a brevidade possível. 

O certo é que o MEC sozinho não vai muito longe. Precisa do indispensável apoio das secretarias estaduais de Educação, às quais incumbe zelar pelo ensino médio.Veja-se que, em nível nacional, dois Estados estão se destacando: Pernambuco e Amazonas. Por que isso? Simplesmente porque implantaram pioneiramente o tempo integral em seus respectivos sistemas. Funcionam em boa parte das escolas no horário elástico das 7 às 17h30, o que é uma notável conquista, que já vai sendo seguida também por Piauí e Goiás. É disso que mais precisamos para ter os fundamentos da renovação pretendida. 

Segundo o MEC, Pernambuco tem hoje mais de 40% da rede de ensino médio em tempo integral e saltou do 21º lugar do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Idep) em 2007 para o 1º lugar na última divulgação de resultados de 2015. É por aí que se deve seguir o caminho iniciado, naturalmente com apoio federal do ponto de vista financeiro, pois sem recursos não se vai longe. Segundo o sonhado Plano Nacional de Educação, prevê-se alcançar 25% de tempo integral na educação básica até 2014, o que é meta bastante razoável. 

Todo esse trabalho será desenvolvido numa intensa parceria com os sistemas estaduais de educação, que respondem por 97% das matrículas do ensino médio público. A eles caberá indicar quais as disciplinas que deverão ser ofertadas na metade aberta do currículo, dentro das seguintes áreas determinadas: linguagens, matemática, ciências sociais e humanas, ciências da natureza e formação técnica profissionalizante. Quem já tiver conhecimentos de inglês e informática, por exemplo, poderá ser liberado ou pular de série, a fim de ganhar tempo. E a segunda língua estrangeira moderna, que já foi o francês, será agora o espanhol, para facilitar negócios com os nossos vizinhos. 

Esses fatos coincidem com o centenário de Democracia e educação, obra lapidar de John Dewey, que foi o livro de cabeceira de Anísio Teixeira na sua temporada nos Estados Unidos. Aos professores, toca a responsabilidade de dizer tudo aos seus alunos, desnudando todas as visões, a fim de que eles possam escolher livremente o caminho a seguir, sem amarras. Isso volta hoje com força total. 

A nova escola média precisa de horários extensos, mas não dispensa laboratórios, quadras e auditórios. Deve experimentar o uso das salas de aula invertidas, a fim de dar ao professor a possibilidade de orientar a aprendizagem, muito mais do que dirigir de cima para baixo o processo de aprendizagem. Será de extrema utilidade que se empregue a pedagogia do diálogo, na relação entre alunos e professores, como nos aconselha o educador português Antonio Nóvoa. 

E nessa viragem que se faz necessária, temos o imenso potencial da educação à distância para explorar devidamente, de forma competente. Desde que foi implantada em 1996, a EAD chegou a 1,7 milhão de estudantes, prenunciando um crescimento consistente daqui para frente. Seria uma pena que desperdiçássemos, num país tão grande, essa oportunidade talvez única.

Correio Braziliense , 11/10/2016