O vulto das reações contrárias ao impeachment de Dilma Rousseff (PT), no seu impacto internacional, põe em jogo o respeito à força de nossa maturação democrática. Depara-se, lá fora, a repetição da crítica e das diatribes a possível violação da nossa constitucionalidade. Questionam-se, ao início do governo Michel Temer (PMDB), da perseverança na consolidação do Estado de Direito, avançado pelos governos petistas. E, de saída, pelo propósito do novo ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, de eliminar a regra, adotada desde o governo Lula (PT), quanto à indicação do procurador-geral da República. A escolha recai sobre o primeiro nome da lista proposta pela própria organização.
Querendo aboli-la, o atual ministro pretendia subordinar ao estrito alvedrio do Executivo esse desempenho, hoje essencial à nossa independência dos poderes. É o que fez Rodrigo Janot, figura essencial no combate à corrupção do sistema. Em boa hora, a presidência Temer desmentiu a proposta de Alexandre de Moraes.
Da mesma forma, avulta o contraste entre o procedimento contra Fernando Collor e o atual, no que o próprio ex-presidente reconhece. E neste mesmo confronto só desponta o empenho da remoção de Dilma, num jogo estritamente político e não de resposta a um ilícito penal.
Desponta também - e inquieta - o intuito do novo advogado-geral da União de investigar o seu antecessor, José Eduardo Cardozo (PT), enquanto este teria atuado como defensor estrito de Dilma, e não da presidente. A veemência de sua voz ecoa diante da desproporção do crime imputado a ela, à míngua, ainda, de prova dos fatos. Ou da evidência em que as ditas "pedaladas" constituíam-se como rotina da prática do Executivo pelas presidências anteriores. A indignação do advogado vai ao imo da debilidade da acusação de Dilma, tornando, ao contrário do que o novo chefe da AGU declara, indissociáveis o pessoal e o institucional, na luta contra o impeachment, no tentar distinguir do proclamado interesse público, ou da estrita defesa do Executivo. O denodo de Cardozo traz um marco, sem volta, à consolidação democrática brasileira. E inquieta, nos fundamentos da nossa ordem pública, o clamor pelas "viradas de página" de todo governo novo, na retórica inevitável de seu moralismo, no noivado com o poder.