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Desespero petista

 

É patética a tentativa de petistas e cúmplices de transformar as conversas gravadas pelo ex-senador Sérgio Machado em provas de que o impeachment da presidente Dilma é parte de um complô para acabar com a Operação Lava-Jato.

Não seria preciso tanto maquiavelismo, pois a própria presidente afastada e seu criador, o ex-presidente Lula, estavam empenhados nesse objetivo.

Os dois estão sendo investigados por obstrução da Justiça, ela por denúncias de que tentou interferir nas investigações a favor de empreiteiros presos.

E há gravações em que Lula diz em alto e bom som que era o único capaz de colocar os “meninos” da Polícia Federal e do Ministério Público “nos seus devidos lugares”.

Tanto que o presidente do Senado Renan Calheiros chega a sugerir na conversa gravada por Machado que a solução seria nomear Lula para o ministério, para neutralizar a presidente, que já estava politicamente inviabilizada.

Não seria preciso, portanto, ser tão maquiavélico, bastando apoiar o governo Dilma com Lula de primeiro-ministro. E por que não foi possível essa manobra? Por que os dois foram apanhados com a boca na botija, tentando obstruir a Justiça.

O que as conversas  gravadas revelam é que todo o mundo político está mobilizado para, de uma maneira ou de outra, tentar controlar o juiz Sérgio Moro, a Polícia Federal e o Ministério Público.

A proposta de Renan de aprovar uma lei restringindo a delação premiada aos acusados que estiverem soltos foi materializada pelo deputado petista Wadi Damous, muito próximo de Lula.

O Supremo Tribunal Federal (STF), por óbvio, virou o alvo preferencial dos ataques, aproveitando citações laterais, ou de bravatas como as do ex-senador Delcídio do Amaral.

Tanto Romero Jucá quanto Renan Calheiros se referiram de maneira genérica a “ministros do Supremo”, enquanto Delcídio citou nomes, e acabou preso.

O fato é que o Supremo Tribunal Federal, com 8 dos seus 11 ministros nomeados ou por Lula ou por Dilma, tem sido a garantia institucional do processo de impeachment, o que o torna um alvo dos petistas relutantes, que precisam desmoralizá-lo para dar ares de verdade à conspiração que inventaram para justificar a perda do poder central.

Diante desse quadro distorcido por interesses partidários, acabou se mostrando providencial a interferência do ministro Luis Roberto Barroso – criticado por mim na ocasião – no rito aprovado pelo então presidente da Câmara Eduardo Cunha.

Embora considere que o regimento interno da Câmara lhe dava o direito de definir como a comissão do impeachment deveria funcionar, hoje entendo que, ao impor um rito mais restrito, com base no processo de 1992, o STF protegeu-se da acusação, que certamente viria, de que colaborou com Cunha para impor um rito desfavorável à presidente Dilma no julgamento na Câmara.

O ministro Teori Zavascki, por exemplo, é volta e meia acusado por petistas de ter deixado Eduardo Cunha agir livremente até que o impeachment fosse aprovado na Câmara, para só depois apeá-lo do poder.

O que o ministro Teori fez, no entanto, foi esperar, até onde o bom-senso permitiu, que a Câmara tomasse uma atitude, para que o STF não fosse acusado de interferência em outro poder. 

É o mesmo Zavascki a quem Romero Jucá admite não ter acesso, por ser “muito fechado”. Então o juiz que estaria envolvido no “golpe” é o mesmo a quem não se tem acesso?

Tudo não passa de uma desesperada tentativa de retroceder um processo que não tem mais volta, pois a presidente afastada, além dos crimes de responsabilidade específicos pelos quais está sendo julgada por uma interpretação legal restritiva, que lhe é favorável, imposta pelo próprio Supremo e pelo Procurador-Geral da República, tem muitos outros crimes a serem investigados, cometidos no seu primeiro mandato.

Diversos delatores já revelaram a ação de seus ministros e assessores em busca de dinheiro desviado da Petrobras para financiamento de sua campanha.

Há indicações “muito claras” nos autos do processo que trata da compra da refinaria de Pasadena de que ela tinha perfeito conhecimento do que estava acontecendo, como presidente do Conselho da estatal.

A coisa é tão sem pé nem cabeça que ao mesmo tempo em que descobrem “provas” do golpe, revela-se que na véspera da votação do impeachment, emissário do futuro presidente teve conversas com Procuradores de Curitiba para garantir inteiro apoio à Operação Lava-Jato.

Se Temer estava chegando ao governo dentro de uma conspirata para controlar as investigações, por que faria um acordo com os investigadores dias antes de assumir?          

 
O Globo, 26/05/2016