As duas vitórias do governismo no dia de ontem paradoxalmente denotam a fragilidade de suas posições, embora confirmem que ainda há poder suficiente para o Palácio do Planalto gastar, mesmo em defesa de causas desgastantes e adotando métodos reprováveis que corroem cada vez mais sua legitimidade.
A vitória de Leonardo Picciani para a liderança do PMDB deu sem dúvida ao governo Dilma um respiro na Câmara, que no entanto não será definitivo, pois a bancada permanece dividida e somente malabarismos como o de colocar de volta na bancada ministros e secretários estaduais garantiram a margem apertada da vitória.
A esdrúxula liminar que adiou os depoimentos do ex-presidente Lula e de sua mulher Mariza também revelou a fragilidade da situação em que se encontram, incapazes de explicar diante da Justiça o imbróglio do sítio de Atibaia e o tríplex do Guarujá.
O atalho permitido pelo Conselho Nacional do Ministério Público é claramente heterodoxo, pois o deputado petista Paulo Teixeira não é parte do processo e sua intervenção não poderia ter sido aceita. Além do mais, a reclamação, se feita pelos advogados do ex-presidente, deveria ter sido encaminhada à Justiça paulista, e não ao CNMP, que não tem autoridade para interferir num processo de investigação criminal já instaurado.
Dentre as muitas estranhezas do processo decisório está a liminar de Valter Shuenquener de Araújo ter sido concedida no fim da noite da véspera do depoimento que os dois deveriam dar ao promotor Cassio Conserino, sabendo-se que a possibilidade de simplesmente não comparecerem foi analisada. Preferiram apelar a heterodoxias jurídicas para guardar as aparências, o que não retirou do ato a significação de, como disseram em nota os Procuradores, se sentirem acima da lei.
Com as manobras no campo jurídico e no Congresso, o PT mostra-se em sua plenitude de manipulador da democracia, utilizando-se de seus mecanismos protetores dos direitos dos cidadãos para desvirtuar esses mesmos direitos, que passam a proteger interesses escusos.
No Congresso, as manobras vergonhosas para mudar transitoriamente a feição da bancada e garantir a nomeação de Picciani à liderança mostram que o governo continua empenhado em uma disputa apequenada pelo domínio imediato do poder, sem pensar nas consequências futuras de sua irresponsabilidade.
Não é por acaso, portanto, que o rebaixamento da nota do Brasil pela Standard & Poor's levou em conta, além da fragilidade política do governo, a intenção já insinuada de aceitar mais uma vez um déficit em vez do superávit primário. A chance de o governo vir a dar um calote dos investidores, tanto internos quanto externos, está hoje maior do que já foi, é o que dizem os números oficiais que a agência de risco interpretou.
O caso envolvendo o ex-presidente Lula é emblemático da tendência autoritária do PT, que vê no seu líder maior uma figura intocável, a quem tudo é permitido. A alegação de que a presença de Lula no fórum criminal de São Paulo colocaria em risco a segurança devido aos protestos que estavam programados é patética, pois um reconhecimento de incapacidade da Justiça fazer frente a manifestantes de qualquer espécie.
A atuação dos milicianos petistas em frente ao Fórum foi mais uma demonstração de que o partido começa a se defender das acusações com paus e pedras, à falta de argumentos. Um paralelo preocupante que se pode fazer com governos autoritários da região, como o da Venezuela e da Argentina kischnerista, que sempre usaram milícias para pressionar até mesmo fisicamente os adversários.
As recentes manifestações da torcida organizada Gaviões da Fiel, levando questões políticas para os estádios de futebol, lembra perigosamente os “barras bravas” argentinos, que também colocavam sua força bruta a serviço dos governos peronistas.
A ligação do ex-presidente Lula com o Corinthians já gerou acusações de desvio de recursos na construção do Itaquerão para a abertura da Copa do Mundo, e a contratação de um filho do ex-presidente para trabalhar no clube sem função definida.
O ex-presidente do clube André Sanchez tornou-se o deputado federal mais votado do país e alardeia sua amizade com o ex-presidente. À revista Época, ele deu a seguinte declaração, que fala por si: "Quem fez o estádio fui eu e o Lula. A parte financeira ninguém mexeu. Só eu, o Lula e o Emílio Odebrecht [presidente do Conselho de Administração da Odebrecht]"