Esta semana, o deputado Heráclito Fortes, hoje no PSB, subiu à tribuna da Câmara para, no seu estilo sarcástico, tripudiar sobre as permanentes quizilas entre PT e PSDB que há 20 anos disputam a Presidência da República entre eles e polarizam os debates políticos no país.
Naqueles dias, os adversários figadais haviam feito um acordo inesperado sobre o projeto que regulamenta a terceirização, motivo do estranhamento de Heráclito Fortes. Ele se referiu a um “amor mal resolvido” entre os dois que, segundo definiu, vivem entre tapas e beijos desde que nasceram e tinham um projeto comum que acabou não se concretizando.
Foi-se o tempo em que um acordo mais amplo entre PT e PSDB fez parte das possibilidades políticas mais instigantes da realidade nacional, e hoje um se considera a antítese do outro, sem que nem sempre tenham razão.
O ex-presidente Fernando Henrique chegou a dizer que, depois da transição republicana em que o PT de Lula sucedeu ao seu PSDB, numa demonstração de amadurecimento político das instituições brasileiras, pensava que seria possível um acordo de alto nível entre os dois para um governo de coalizão que dispensasse a dependência de pequenos partidos fisiológicos.
Não foi o que aconteceu, ao contrário. Entrou em campo a “herança maldita” e nunca mais os adversários cordiais se entenderam.
A fixação do PT na figura do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso é já folclórica, mas o PSDB também está se utilizando de exemplos históricos do PT para justificar sua atuação mais agressiva na oposição hoje em dia.
Para se defender da acusação grave do Tribunal de Contas da União ( TCU) de que feriu a Lei de Responsabilidade Fiscal com as famosas “pedaladas contábeis”, o PT saiu-se com uma explicação pueril pelas bocas nada infantis do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e do advogado-geral da União, Luís Inácio Adams.
Os dois, sem poder desmentir as estripulias nas contas públicas, defenderam-se alegando que a mesma prática existia desde 2001, isto é, desde o segundo governo de FHC, justamente o implementador da Lei de Responsabilidade Fiscal que deu organização fundamental às contas públicas nacionais.
A admissão de culpa oficial só fez piorar o quadro, pois deveriam saber as duas autoridades do governo petista que cuidam das leis que um crime não justifica outro, e que o fato de outros governos terem cometido o delito — o que os tucanos negam enfaticamente — em nada ajuda a absolver o governo petista.
Mas o PSDB também faz jus à crítica de Heráclito Fortes, pois vem mantendo uma oposição ferrenha ao governo Dilma e, sempre que pode, cita as atitudes petistas quando na oposição para justificar a atual atitude radical.
É verdade que as ruas estão a exigir das oposições uma ação mais agressiva, e a campanha presidencial de 2014 mostrou que a atitude mais firme do então candidato Aécio Neves quase o levou à vitória.
Mas os tucanos não precisam lembrar que os petistas também pediram o impeachment do presidente Fernando Henrique, nem justificar a ferocidade com que atacam os adversários com o comportamento semelhante que o PT adota quando na oposição, até nos estados e municípios.
A luta política que o PSDB desenvolve no momento, buscando criar condições para destituir a presidente Dilma ou, se não for possível, desgastá-la ao máximo, faz parte da democracia e dizer que é golpismo não passa de uma tentativa de constranger o adversário. Não é preciso lembrar sempre o PT para justificar a mudança de atitudes, mesmo porque há razões de sobra para criticar o PT diante do descalabro que é este governo.