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As Nações e o califado islâmico

 

Os últimos dias aceleraram internacionalmente as interrogações sobre a amplitude do conflito com o Isis e a radicalização que ele impõe ao confronto com o Ocidente. E, de saída, pelo propósito de ruptura radical com a civilização como a entendemos, erradicando a memória das coletividades e derrubando, por completo, os monumentos representativos da cultura assíria e babilônica. Identicamente, precisa-se a consciência dessa radicalidade e do que seja, inclusive, o primeiro sucesso das imitações do movimento, tal como a do Boko Haram, na Nigéria. Querendo ganhar um prestígio global, essa insurreição busca uma reorganização de fronteiras de uma política muito mais de saque e apropriação grupai do que da eliminação sumária dos contendores, como o Isis, no Oriente Médio.

Ao mesmo tempo, desaparece, de vez, qualquer propósito das Nações Unidas de buscar uma mediação com os rebeldes de Abu Bakr. Mesmo porque se esvazia, com o Isis, qualquer interlocução internacional de reconhecimento das soberanias, como a entenderam os tempos modernos. Emerge a defesa de um califado tal como definido nos tempos de Maomé e tal como exprime o Corão, na submissão radical e inquestionável dos seus adeptos aos mandamentos religiosos originais.

No extremo dessa ruptura, os responsáveis pelo Isis consideram, inclusive, que a própria noção dos direitos humanos é um produto do imperialismo ocidental. Mesmo porque, na visão islâmica, não é o indivíduo, e sim o coletivo que ganha sentido histórico. E este baseado na estrita e rigorosa negação do outro, recusando qualquer possível convivência da coletividade que não a do califado. Os encontros, por outro lado, que se desdobram diante dessa ameaça inédita atentam às possíveis fissuras que essa radicalidade leva aos seus quadros. Começa neles a despontar uma possível rebeldia em que se poderia localizar, já, a tensão emergente entre a Al Qaeda e o Isis.

Deparamos, na destruição das Torres Gêmeas, um movimento de afirmação da diferença entre as culturas, a partir da sufocação que o mundo islâmico teria enfrentado, desde os últimos séculos, frente ao domínio ocidental. Um novo terrorismo, entretanto, desses dias, não é mais o da garantia do confronto e sua possível estabilização, mas de eliminar-se o outro, na vitória última, da forma mais radical, do islamismo.

Diante dessa ameaça inédita, afinal, a interrogação que se abre, nesses últimos dias, e na sequencia do acordo de Obama com o Irã, é de se vão os Estados Unidos à liderança da ação armada e radical contra o Isis ou se deixarão a iniciativa às Nações Unidas. E o argumento básico em favor da última é o de que, até agora, a mobilização militar contra o Isis envolve, tão só, a cooperação de Washington com a União Europeia. A interrogação decisiva, neste momento, é de porque a totalidade dos países latino-americanos não foram a esse empenho. A distância geográfica e cultural não pode deixar o nosso continente à margem dessa consciência global, frente aos crimes inéditos contra a humanidade, nascidos sem volta, do Estado Islâmico.

Jornal do Commercio (RJ), 17/04/2015