Pelo segundo dia consecutivo uma autoridade da Republica faz críticas públicas à falta de transparência e controle nas contas da Petrobras. Na segunda-feira o ministro chefe da Controladoria-Geral da União (CGU) Jorge Hage criou embaraços ao Palácio do Planalto ao despedir-se do cargo lamentando que as estatais brasileiras estejam protegidas dos controles governamentais, fora do sistema de acompanhamento de gastos das contas oficiais.
No seu discurso, Hage defendeu a ampliação do sistema de controle interno do Poder Executivo, considerado por ele como “incompleto”. O ministro fez uma crítica indireta ao governo ao qual serviu por 12 anos ao afirmar quer uma “ampliação e complementação” do sistema só acontece se houver “vontade política” de investir mais em controle e prevenção da corrupção, com uma mudança de patamar nas dimensões do sistema de controle.
Ontem foi a vez do Procurador-Geral da República, que sugeriu a demissão coletiva da diretoria da Petrobras. Na abertura da Conferência Internacional de Combate à Corrupção, Rodrigo Janot chamou o escândalo de corrupção na Petrobras de “incêndio de grandes proporções” e defendeu uma reformulação completa na estatal, com mais “rigor e transparência”.
Tendo sido acusado de estar trabalhando por uma solução que livre as empreiteiras de serem consideradas inidôneas, com pagamentos de multas sem condenações, o Procurador-Geral da República garantiu que ninguém deixará de ser punido, garantindo que os corruptores pagarão com a cadeia e terão que devolver aos cofres públicos o que desviaram.
“A resposta àqueles que assaltaram a Petrobras será firme, na Justiça brasileira e fora do país”, disse Janot, referindo-se ao fato de que o escritório de advocacia americano Wolf Popper LLP está processando a estatal brasileira por não revelar “a cultura de corrupção dentro da companhia”. Ao chamar de “cenário desastroso” a gestão da companhia, e pedir a demissão coletiva da diretoria, Janot atacou diretamente a atual presidente Graça Foster, amiga da presidente Dilma que quer mantê-la no cargo apesar de todos os problemas.
Foi por isso também que o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo passou um vexame ontem. Ele estava presente quando o Procurador-Geral da República fez as críticas à diretoria da Petrobras, e não viu razão para contestá-lo na hora. Depois, no entanto, de conversar com a presidente Dilma, ele convocou uma coletiva de imprensa para defender a diretoria, em especial Graça Foster.
Mais uma vez o ministro da Justiça foi obrigado a sair de seu papel institucional para atuar em um campo que não diz respeito a seu cargo, defendendo diretores de uma estatal ou, como fez outro dia, defendendo o próprio Partido dos Trabalhadores das acusações de ter recebido doações com dinheiro desviado da Petrobras.
Nos dois casos, Cardozo atuou como partidário, e não como uma autoridade da República. O perigo dessa conduta é levantar a suspeição de que esteja agindo assim para se colocar como candidato a uma indicação ao Supremo Tribunal Federal (STF), o que transformará sua indicação pela presidente Dilma em um aparelhamento partidário semelhante ao que já aconteceu com a indicação de Dias Toffoli pelo presidente Lula.
Outro que tenta se posicionar para uma indicação ao STF é Luis Adams, advogado-geral da União, que também saiu de seus cuidados para defender a presidente Dilma, tomando as dores do PT. Segundo ele, em 2010 os petistas contavam com uma equipe jurídica que atuava para impedir ilegalidades.
O fato é que o problema político do governo só faz aumentar à medida que o caso Petrobras ganha contornos de escândalo internacional, com investidores nos Estados Unidos processando a estatal, acusando sua direção de ter escondido os graves problemas de corrupção que ocorriam na empresa.
A presidente da Petrobras Graça Foster, e a presidente Dilma, que presidia o Conselho Administrativo por ocasião da compra da refinaria de Pasadena nos Estados Unidos, podem ser responsabilizadas pessoalmente pelos eventuais prejuízos causados aos investidores.
O Globo, 10/12/2014