No programa do dia 9 de março de 2014, o Fantástico, da TV Globo, chocou profundamente os seus milhões de telespectadores com a apresentação de uma reportagem sobre algumas das nossas escolas do interior. Não importa que sejam de Alagoas ou do Maranhão. O fato é que a sensação de abandono, por parte dos poderes públicos, é de causar revolta no mais sereno dos cidadãos.
A precariedade é total, denunciam os heroicos professores que suportam vicissitudes, como a falta de água potável, a ausência de banheiros (os alunos procuram o mato para fazer suas necessidades) e a irregularidade na distribuição da merenda, levando muitos alunos a passar fome.
Transporte escolar? É um sonho. Crianças andam quilômetros para sair de casa até as escolas ou pegam carona em caminhões, numa lamentável promiscuidade. Se chove, o que é raro, então é melhor mesmo ficar em casa. A escola não é alcançada – e as autoridades pouco se incomodam com as faltas.
Alguns alunos têm aulas debaixo de frondosas mangueiras, como acontecia há 500 anos, nos tempos da ação jesuítica entre nós (especialmente José de Anchieta). Se há um prédio caindo pelas tabelas, como é comum, faltam carteiras em número suficiente, além do calor insuportável. Luz? É um luxo para umas poucas, pois em muitas delas não passa energia nem por perto. Além disso, existe a praga das escolas multisseriadas, em que o mesmo professor leciona para turmas de diversas séries, concomitantemente, e o resultado, em termos de aproveitamento, bem pode ser imaginado.
A reportagem, que focalizou escolas estaduais e municipais, afirma que temos cerca de 87 mil escolas com esses tipos de precariedade. Uma professora, ainda mais otimista, fez uma preleção para os seus atônitos alunos: “Vocês são o futuro da Nação!”
Que futuro se pode esperar? Somos bombardeados por promessas sucessivas de atendimento, mas a realidade é bem outra. Em época eleitoral, como a que se aproxima, as promessas recrudescem. Vemos na televisão como os candidatos se esmeram. Alguns são eleitos, depois nada se cobra deles, e fica tudo por isso mesmo. Devemos ser mais cuidadosos na escolha dos nossos representantes, sob pena de não sairmos desse círculo vicioso.
Essa espécie de abandono sacrifica os ideais de crescimento harmônico do nosso povo. Temos boas escolas, em algumas delas até não falta nada (ou quase nada), mas essa desigualdade é profundamente lamentável e precisa ser corrigida.
E curioso que ainda há teóricos que enchem os jornais de comentários sobre as maravilhas das tecnologias educacionais, falam em lousas eletrônicas, querem a internet em todo o nosso território e não deixam de pleitear banda larga como conquista democrática. Na prática, como estamos cansados de verificar in loco, há muito a ser feito em matéria de educação, sobretudo nos estamentos mais baixos. Cuidar das nossas crianças do interior é uma questão de justiça.
Jornal do Commercio (RJ), 21/3/2014