A vitória, afinal, de Obama no impasse orçamentário é muito mais do que o ganho, de vez, de uma prospectiva do horizonte, a longo prazo, do futuro americano. De princípio, pela redução da força eleitoral do Tea Party como núcleo duro do republicanismo do país. Reduziu-se sua ascendência sobre a opinião pública, de par com o seu endurecimento radical. Não comportou variações ou dissidências. Assentou-se, de maneira irrevogável, como o radicalismo de direita no país. Não há como subestimar, entretanto, em termos eleitorais, o vulto despropositado de seus financiadores, concentrados em três ou quatro gigantescas companhias, e, sobretudo, nos fundos dos irmãos Hubble.
O ganho democrático destes dias é o desta recuperação histórica, eliminando o atraso substancial do país na área do atendimento médico, com a universalização dos planos de saúde privados e a ampliação do sistema de saúde pública para os cidadãos de baixa renda, a que Obama ligou o seu futuro político. Trata-se, na verdade, de assentar o próprio welfare state da modernidade dos Estados Unidos, bloqueados, ainda, pelo liberalismo dos founding fathers.
O mundo desta nova globalização não hegemônica enfrenta desequilíbrios sociais resultantes do incremento das migrações. Todos os países europeus já reagem ao fenômeno, e aí vemos um paradoxo, com os próprios governos socialistas, como o de Hollande, reiterando suas políticas de controle, ora evidenciadas na remoção territorial de famílias de ciganos. São os indesejáveis, numa tônica geral, que inquietam, em um novo etnocentrismo, na dimensão europeia do Primeiro Mundo. E a agenda renovada de Obama insiste, inclusive, nessa dimensão, a contrarrestar o que parece ser um êxodo das periferias, diante das perdas de esperança, neste meio século de políticas públicas internacionais – especialmente na África – de luta contra a miséria e a marginalidade social.
Repetem-se, nas diversas nações do Ocidente europeu, tais medidas restritivas, como o interdito sumário à concessão de vistos de entrada aos que não comprovarem proficiência na língua do país para o qual pretendem imigrar e a apresentação de níveis razoáveis de escolaridade. Aprofunda-se também a tendência começada há uma vintena, na Alemanha, de fechar suas fronteiras a muçulmanos, agravada pelo 11 de Setembro, com as suspeitas de terrorismo. Significativamente, o problema não foi, sequer, levantado na última Assembleia das Nações Unidas, e a China e a Rússia continuam como os grandes mudos no Conselho de Segurança.
Vem, a favor do humanismo de nosso tempo, o exemplo do Papa Francisco, em Lampedusa, na acolhida e na assistência dos náufragos das embarcações desgarradas das costas africanas.
Jornal do Commercio (RJ), 25/10/2013