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A volta de Guimarães Rosa

 

Ao falar, numa das sessões da Maratona Escolar Guimarães Rosa, na Biblioteca Euclides da Cunha, situada na Ilha do Governador, tive que responder a uma interessante pergunta de um jovem aluno da Escola Municipal Gurgel do Amaral: “Qual a relação que existe entre a leitura e o ato de escrever?”
                                      
É uma espécie de relação causa/efeito.  Para escrever bem, e com relativa facilidade, é essencial que a  pessoa tenha lido muito, desde cedo.  Ele engrenou uma segunda: “Foi o caso de Guimarães Rosa?”  Não tive como negar que o autor de “Sagarana” tenha sido um grande e compulsivo leitor.
                                       
No auditório de 100 lugares, as professoras municipais da 11ª. Coordenadoria Regional de Educação prepararam uma linda festa, antes da conferência.  Primeiro, dois  rapazes cantaram ao violão uma música que tinha como tema o sertão, no ritmo do funk.  Tudo produzido por eles.  Depois, meninos e meninas de escolas municipais do Rio fizeram uma encenação de parte da obra de Guimarães Rosa, utilizando grande criatividade.  Assim eles se preparam para enfrentar os desafios da Maratona Escolar, em que têm que escrever redações criativas sobre a vida e a obra do grande escritor mineiro de Cordisburgo.  É uma iniciativa vitoriosa da Secretaria Municipal de Educação, que tem o apoio institucional da Academia Brasileira de Letras.
                                        
Despertamos o interesse da plateia com algumas manchetes a respeito de Rosa.  Inclusive, a sua atuação como diplomata, na cidade de Hamburgo, em plena II Guerra Mundial, quando, ao lado da esposa Aracy,  concedeu mais de 100 vistos para judeus alemães que se encontravam ameaçados de extermínio pelo nazismo.  Assim, eles puderam embarcar para o Brasil, em busca da salvação, embora isso tudo tenha sido feito ao arrepio do governo do ditador Getúlio Vargas, que, na época, andava de namorico com Adolf Hitler.  Coragem do casal.
                                         
Guimarães Rosa  era muito tímido.  Nas festas, ficava de lado, sem procurar muita conversa.  Gostava mesmo é de  ir para o mato, em Minas ou Mato Grosso.  Com  o seu caderno, anotava expressões de jagunços e caboclos, para depois colocar nos seus livros, como aconteceu no famoso “Grande Sertão:  Veredas”, o mais conhecido deles todos.  Aliás, nesse romance se desenvolve a relação entre Riobaldo e Diadorim, este sempre vestido de homem.  Só se descobre que era uma bela mulher quando morre, assassinada.
                                           
Pude ainda falar sobre a estranha posse de Rosa  na Academia Brasileira de Letras.  Ele fora eleito por unanimidade, era um sonho que se realizava, mas dizia aos amigos que não poderia tomar posse.  O seu coração não resistiria a tanta  emoção.  Adiou a cerimônia por  três anos e, afinal, vencido pelos conselhos de muitos amigos,  resolveu aceitar a posse.  Fez  um belíssimo discurso.  Quatro dias depois,  faleceu.  Foi vencido pela emoção.
                                           
O  mais curioso nisso tudo é que Guimarães Rosa era médico formado, conhecia como ninguém as suas próprias limitações.

Jornal do Commercio (RJ), 27/9/2013