Na primeira visita de João Paulo 2º ao Brasil, em julho de 1980, o cardeal Eugenio Sales indicou meu nome para integrar a comitiva papal. Pude, assim, acompanhar o pontífice desde Roma até as diversas capitais que visitou, inclusive Manaus, que foi a última. Já estávamos instalados no avião que levaria o papa de volta a Roma quando, estranhamente, houve atraso no voo.
Ficamos sabendo que dom Hélder Câmara, arcebispo de Recife/Olinda, tinha uma encomenda para Sua Santidade, e que seu avião estava atrasado. Esperou-se o famoso homem de Deus, que afinal chegou e subiu a bordo para se despedir e presentear o papa.
Durante sua estada na capital pernambucana, o papa hospedou-se no Palácio Episcopal, quando provou pela primeira vez a preciosa papaia nacional. Gostou muito, quis mais, foi servido abundantemente pelo seu amigo e hospedeiro. Daí que dom Hélder decidiu presenteá-lo com um caixote de papaias maduras.
O papa pediu ao monsenhor Romeo Pancirolli, mais tarde bispo, um de seus secretários, que o caixote não fosse para a despensa do Palácio Apostólico, onde morava, mas fosse diretamente para seus aposentos particulares. Dom Hélder vibrou.
Chegando a Roma, no dia seguinte fui apanhar umas fotos da viagem com Arturo Mari, fotógrafo oficial e pessoal de João Paulo 2°, cujo estúdio ficava ao lado da Redação do "L'Osservatore Romano", bem em frente a uma das janelas laterais do quarto de Sua Santidade. Era manhã e Arturo pediu cuidado ao pisar na calçada embaixo da janela. Algumas pessoas já tinham derrapado nas papaias esborrachadas. A Comlurb do Vaticano ainda não havia passado. Alguém, daquela janela pontifical, havia se livrado do valioso e saboroso presente que o papa recebera do Brasil.
Folha de S. Paulo, 10/3/2013