Repercute, hoje, internacionalmente, o avanço democrático brasileiro, expresso na consolidação do Conselho Nacional de Justiça e no reforço dos direitos humanos, ou, agora, na Comissão da Verdade. Sobretudo, desponta uma nova articulação entre o nosso regime político e o sistema federativo, instalado com a República, mas deixado até nossos dias à margem das mecânicas de centralização do poder. Devemos a Rui Barbosa a implantação na República " do sistema, no estrito transplante do regime americano. Mas chegamos, praticamente, até o novo século sem qualquer regionalização funcional do poder, como evidenciou o regime do "café-com-leite", na Velha República, na troca entre Minas e São Paulo, da nascida instrumentação dos poderes da União.
A Carta de 1988 foi a primeira em que uma verdadeira divisão do trabalho nas políticas públicas do país transferiu para os estados e municípios a política social, assentada, na educação, saúde e habitação. Mas os enterros iniciais dessa descentralização voltaram a marcar a iniciativa do Planalto, expressa nas múltiplas realizações do PAC, de Lula e Dilma, e no êxito do SUS, como inédito na atualidade. Avança, agora, a iniciativa da Alae, reunindo deputados estaduais de todo o país, a reivindicar a descentralização, de vez, das políticas públicas e o entrosamento na tarefa dos estados e municípios. As contradições da pobreza brasileira não brotam do interior, mas das periferias das supercidades brasileiras, a reclamar a compensação desse desequilíbrio de crescimento. Está defronte do velho contraponto entre o Brasil interior e o Brasil urbano. Sobretudo, a Alae dá-se conta da conjugação do novo pacto federativo, com as exigências do desenvolvimento sustentado, a invocar, na sua aceleração, o comando central dessa política na imediata distribuição de riqueza, ameaçada pela concentração da nova prosperidade ou pela reordenação do território desses 64 milhões de brasileiros saídos da marginalidade na última década.
O problema do assento territorial que reclama a Federação brasileira supõe, também, o cotejo dos recursos nacionais quando se perfila, agora, a massa gigante de dinheiros vindos ao erário público diretamente não da fiscalidade clássica, mas da direta exploração do subsolo oceânico, no horizonte que mal se descerra do pré-sal. Dinheiros que exigirão uma nova regra matricial de distribuição ou poderão delongar toda a vigência do novo pacto federativo, em bem do unilateralismo das alocações do Planalto?
A Federação, deixada como utopia durante mais de século, e a serviço das velhas clientelas brasileiras, pode agora ser vitimada pela prosperidade descomunal da nossa riqueza submarina, escapada, de vez, da nossa cidadania tributária.
Jornal do Commercio (RJ), 25/5/2012