Faltam ainda dois anos para a Copa de 2014 e, de minha parte, declaro que já estou de saco cheio de tudo o que está sendo discutido, prometido, negado e negociado a respeito dela.
Em 1950, na Copa daquele ano que marcou a inauguração do estádio Mário Filho, houve mais trabalho do que conversa para enxugar gelo. Lembro o violento debate na Câmara Municipal entre os vereadores Carlos Lacerda, que desejava o estádio em Jacarepaguá, e Ary Barroso, que lutou e venceu pelo Maracanã.
Mas o assunto foi resolvido a tempo e a hora sem encher a paciência de ninguém. Daqui a pouco, antes mesmo da Copa, todo mundo estará tão farto dela que acreditará no absurdo: mesmo sem ter sido realizada, ela já aconteceu, todos falarão em antes e depois da Copa, no gol de Neymar contra a Argentina e na expulsão de Ronaldinho Gaúcho.
Coisas muito anunciadas não precisam acontecer. Há o caso de Tartarin, personagem de Alphonse Daudet, presidente de um clube de caça em Tarascon, sul da França. Ele avisou que iria caçar leões na África, passava as noites com os sócios do clube, explicava as dificuldades, os perigos, a fúria dos animais que se recusavam a serem caçados.
Passaram-se exatos dois anos em que Tartarin, todas as noites, vinha com novidades, os preparativos, as armas, as tendas a serem montadas nas vastidões africanas.
Até que um dia, sem qualquer combinação prévia, toda a Tarascon acreditou que Tartarin já tinha ido caçar leões e já voltara, coberto de glória e troféus.
No início, o próprio Tartarin ficou meio desconfiado, mas acabou aceitando como fato consumado sua heroica façanha. Todas as noites, no clube de caça, os tarasconeses se reuniam para ouvir as fantásticas aventuras de Tartarin contra os leões.
O Estado de São Paulo, 25/3/2012