Não sei se é verdade, mas sempre ouvi dizer que o pessoal da Máfia, para receber um novo membro, obriga o candidato a fazer um furinho no dedo indicador da mão direita e espremer até que saia pelo menos uma gota de sangue.
Por sua vez, o mestre que o recebe faz o mesmo. Com o sangue dos dois, é assinado um pacto que deverá valer até a morte -e, às vezes, até depois da morte do novo agente da Cosa Nostra.
Estou me lembrando da cerimônia mafiosa porque ignoro se a Fifa e o governo brasileiro fizeram um pacto semelhante, na ocasião em que escolheram o Brasil para sediar a próxima Copa do Mundo. Acredito que não chegou a haver derramamento de sangue, mas que houve algum compromisso, houve.
Em nome desse compromisso, parece que a Fifa está fazendo exigências que ameaçam a soberania do Brasil. Coisas pequenas, detalhes de detalhes, sobre meia-entrada para os idosos, bebidas alcoólicas, franquias publicitárias etc. Não sabemos ainda no que a briga vai dar. Há gente que acredita no cancelamento da Copa, inclusive porque, além do pacto furado, há considerável atraso nas obras necessárias para o grande evento esportivo.
Se os mafiosos obedecem aos pactos na base do sangue, os países e as entidades, profanas em relação à Máfia, sempre dão um jeito de escamotear os compromissos assumidos. No caso da Copa, não sei ainda quem está violando o quê.
Pulando de cenário: no final do regime militar, houve um pacto entre a ditadura e a oposição, do qual resultaram a anistia política e a redemocratização do país. Nesse pacto houve também derramamento de sangue, não apenas de um dedo, mas de todo um corpo. A Comissão da Verdade, para apurar os crimes daquele tempo, não violará o pacto. Apenas dará nome aos bois.
Folha de S. Paulo (RJ), 13/3/2012