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Singapura ou Cingapura?(Fim)

 

No seu 'Dicionário onomástico etimológico da Língua Portuguesa', o eminente filólogo José Pedro Machado assim comenta a escrita 'Singapura':

“Um fato a reter é que nos  textos do século XVI qualquer das duas formas mencionadas, ambas com muito uso, aparecem, quase sempre, com c- inicial, o que poderia indicar obediência a fato comum, se não se estivesse já nos meados do século XVI, quando em português já não se fazia distinção entre -c- e -s- em  muitas das suas -zonas. Custa  a crer em caso de disciplina ortográfica em época que a desconhecia e ainda menos em forma de importação recente e de uso pouco vulgar aqui em Portugal. Modernamente impôs-se a grafia ‘Singapura’, por generalização ou por influência inglesa. De lamentar, a propósito, esta posição:o Vocabulário da Academia das Ciências de Lisboa de 1940 registra, e pretende justificar, a escrita ‘Cingapura’; sete anos depois, o ‘Resumido’ esqueceu este caso importante na lista vocabular; antes, porém, o Acordo Ortográfico Luso-Brasileiro de 1945 preconizara ‘Singapura’ no nº 3 da sua Base V.” (pág. 1.352, vol. III, Lisboa, 1984).

Havendo razões históricas para justificar a escolha de qualquer das duas formas, é fácil entender o fato de ‘Cingapura’ ter sido a vitoriosa entre brasileiros, enquanto ‘Singapura’ passara a vigorar em Portugal. Antes do Acordo de 1945, a aceita em Portugal e no Brasil era a escrita com ‘c’; 1945 decidiu-se pela escrita com ‘s’. Como o Brasil rejeitou, à época, este Acordo de 1945, fica explicada sua opção por ‘Cingapura’. Enquanto a comunidade científica dos geógrafos e disciplinas afins não puser luzes neste assunto, podem, com toda razão, vigorar as duas formas.

Nos bons dicionários elaborados  no Brasil, Houaiss  optou por ‘Cingapura’, e o Aurélio por ‘Singapura’. O Acordo  de 1990 registra a escrita com ‘s’, por ser um texto que tomou por modelo o sistema de 1945; mas a verdade é que, neste particular, se antecipou à última palavra a ser dada, futuramente, pelo vocabulário ortográfico da terminologia geográfica e ciências afins. Enquanto a decisão não vier, são válidas as duas grafias. Foi a lição que tomou certeiramente, assim o julgamos, a 5ª edição do VOLP da ABL, registrando os gentílicos ‘cingapurense’, ‘cingapuriano’, ao lado de ‘singapurense’; pois não registra  nomes próprios, e, depois dela, o Volp da Porto Editora, sob orientação científica de João Malaca Casteleiro, membro da equipe portuguesa do Acordo de 1990, registrando ‘cingapurense’, ‘cingapuriano’, ao lado de ‘singapurense’.  

Neste caso de ‘Singapura’, a opção do texto oficial de 1990 foi silenciosa, sem nenhuma advertência ao leitor; há ainda neste texto lições sem advertências suplementares ou visíveis contradições—felizmente raras—, como o tão comentado co-herdeiro hifenado na alínea a) do item 1º da Base XVI que contradiz a observação da alínea  b) do mesmo item, que declara que nas “formações com o prefixo co- este aglutina-se em geral com o segundo elemento”. Críticos desavisados, que não conhecem o histórico da ortografia e se metem a dar palpites infelizes contra decisões ponderadas, poderão supor que espeitando o texto oficial de 1990.

O Dia (RJ), 1/1/2012