Acerca da grafia dos nomes geográficos, os topônimos, assim se pronuncia Gonçalves Viana, no livro “Ortografia Nacional” (Lisboa, 1904): “A maior parte da antiga nomenclatura que usaram os nossos escritores desde o século XV, e mesmo antes até o princípio do século passado, vai caindo em desuso ou sendo menosprezada, não se tendo na devida conta que esse vocabulário e as formas genuinamente portuguesas de nomes próprios de mares, de rios, de terras, de povoações, de quaisquer localidades enfim, fazem parte essencial do léxico nacional, tão essencial como as demais dições da língua pátria. A maioria, senão todos os compêndios empregados no ensino geográfico vêm inçados de denominações estrangeiras ou estrangeiradas, malformadas umas, falsas outras, ilegíveis muitas delas, e não poucas inúteis por já existirem na língua outras, ou melhor autorizadas por bons escritores nossos, ou mais conformes com a índole e particularidades de pronúncia do idioma que falamos e sua ortografia tradicional, cujas feições típicas são característico nacional de tamanha valia como outro qualquer dos que nos diferençam dos demais povos.”(p.227).
Esta posição do notável foneticista lusitano tem sido a doutrina mais seguida em Portugal; todavia, tem facilitado o aparecimento de formas divergentes usadas por brasileiros, que se mostram mais receptivos à adoção de grafias estrangeiras, mormente francesas ou inglesas, por considerá-las como propriedades internacionais da humanidade, segundo palavras de Said Ali, em artigo sobre o tema, inserido desde a 1ª edição das “Dificuldades da Língua Portuguesa”, em 1908, quando transcreve posição do Congresso de Geógrafos de 1893: “As relações sempre crescentes e o intercâmbio intelectual entre as nações obrigam-nos a considerar os nomes geográficos não já como fazendo parte da língua da pessoa que fala ou escreve, mas como propriedade internacional da humanidade. A sua escrita e pronúncia, excetuadas algumas poucas formas tradicionais, não mais deve oscilar de nação para nação, mas fixar-se pelo menos em sua forma principal, ainda quando formas secundárias em muitos casos continuem a existir.” (pág. 189 da 7ª edição).
Em vista dessa dupla maneira de ver, surgem divergências do tipo de Moscou e Moscovo, Amsterdam e Amsterdão, Stuttgart e Estugarda, a primeira das quais brasileira e a segunda portuguesa. Quanto à grafia de Singapura ou Cingapura, a comunidade dos estudiosos de língua portuguesa ainda não decidiu qual a melhor forma a ser escolhida. O “Vocabulário Ortográfico da Academia das Ciências de Lisboa”, de 1940, registra a forma Cingapura, esclarecendo ser esta “a grafia preferível a Singapura” (pág. 74).
Já o Acordo de 1945, tendo à frente o mesmo ortógrafo lusitano que organizou o referido Vocabulário para a Academia das Ciências, o filólogo Rebelo Gonçalves muda de lição e opta por Singapura, com s- inicial. O “Tratado de Ortografia da Língua Portuguesa”, saído em 1947, elaborado pelo mesmo filólogo Rebelo Gonçalves, para explicar a proposta de 1945, a respeito da nova opção Singapura, com s- inicial, justifica assim pela nota (4) da pág. 41: “Se bem que o Vocabulário de A.C.L. tenha registrado a escrita com ‘c’, Cingapura, fundando-se na preferência que lhe dão filólogos do nosso tempo (entre outros, Cândido de Figueiredo, “Novo Dicionário”, Apenso Geográfico), não nos repugna, antes pelo contrário, que na Base V do Acordo Ortográfico se haja preferido Singapura. A verdade é que se a escrita com ‘c’ tem abonação de Barros, Camões, Castanheda (Cingapura), Mendes Pinto (idem), a escrita com ‘s’ ocorre também em escritores antigos (...); é a que se torna corrente do século XVIII em diante; e tem a vantagem, decerto apreciável, de não destoar das formas correspondentes de outras línguas modernas”. (continua)