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Nem Nem nem ninguém

 

Como sempre, a mídia fez o habitual espetáculo com a prisão do bandido Nem, considerado oficialmente o "capo" do tráfico na cidade -principalmente em alguns pontos tradicionais, como o da Rocinha, favela estratégica que divide topograficamente a zona sul (Leblon, Gávea, Ipanema) da mais profunda Barra da Tijuca, com seus condomínios emergentes e atalhos que abrem o caminho para São Paulo e para resto do Brasil.

Antes de Nem, tivemos outros chefes do tráfico carioca -sem esforço de memória, posso citar Escadinha, Fernandinho Beira-Mar, Lúcio Flávio, Tião Medonho. E todos eles, na hora do aperto, revelavam que dividiam o lucro do tráfico com policiais civis e militares. Nenhuma novidade em si.

Talvez o suborno não chegasse a R$ 1 milhão, mas para um soldado que ganha R$ 1.000 ou R$ 1.200 por mês, arriscando a vida, a oferta de R$ 5.000 ou R$ 10 mil já é atraente.

O problema desse tipo de criminalidade é que a vigilância policial ou militar fica restrita às pontas, às bocas de fumo, aos principais traficantes quase todos manjados e localizados. Acontece que o Brasil não produz cocaína, limita-se praticamente à maconha, que não é considerada uma droga pesada (vide Fernando Henrique Cardoso).

Só para dar um exemplo, na época da Lei Seca nos Estados Unidos, quando foram proibidas a fabricação e a venda de bebidas alcoólicas, um dos maiorais que dava cobertura à intrincada rede de contrabando era o embaixador norte-americano em Londres, pai do futuro presidente John F. Kennedy.

Em linhas gerais, mudando-se nomes e circunstâncias, a questão é a mesma. Nada de novo sob o sol.

No início de tudo, segundo o relato bíblico, Jacó subornou seu irmão com um prato de lentilhas, inaugurando a banda podre da sociedade humana.

Folha de São Paulo, 13/11/2011