Desde criança que não entendo o mundo em que vivo. E agora, muito menos. Penitenciei-me no último fim de semana lendo os programas dos candidatos presidenciais da eleição de 2010, sobretudo o de Dilma.
Ela falou de muitas coisas, prometeu outras, continuação da era de ouro petista, combate à fome e a erradicação da miséria, prioridade para programas sociais, falou até em aborto e células-tronco.
Não falou, por julgar desnecessário, em corrupção; os oito anos de Lula teriam sido impecáveis, imaculados, embora o caso da Erenice, que a substituiu na Casa Civil, tivesse provocado um terremoto que foi imediatamente blindado para salvar a sua candidatura presidencial.
Oito meses apenas de mandato e o programa elaborado por ela e sua equipe parece ter ido para o espaço. A máquina governamental está rateando, um único assunto ocupa a mídia, as redes sociais, as conversas das ruas, velórios e retretas.
Outro dia, fui abordado por um cidadão na calçada da Academia Brasileira de Letras. Julgando-me autoridade ou coisa que o valha, e achando que a ABL, com sua nobre fachada de Petit Trianon, fosse uma repartição, cobrou-me uma atitude contra a corrupção reinante.
Ora, eu ia em busca do meu mestre Evanildo Bechara, para saber se afinal a palavra "herói" tem ou não tem acento -o corretor do meu notebook ainda não está atualizado.
O sujeito olhou-me escandalizado, deve ter pensado que o Brasil não vai para frente por causa de tipos alienados como eu.
Ainda bem que a Associação Brasileira de Imprensa, dirigida pelo Maurício Azêdo, está pensando em botar a sociedade nas ruas, tal como foi feito no passado, quando do impeachment de Fernando Collor de Mello.
Não precisarei pintar a cara como os jovens daquele tempo fizeram. E terei a vantagem de aprender se herói tem ou não tem acento.
Folha de São Paulo, 23/8/2011