Os jornais não deram destaque, nenhum deles contou a história do servo-croata que passou horas detido no aeroporto do Galeão. Ele visitara o Corcovado, se esborrachara nas escadas que dão acesso ao Cristo, teve de colocar grampos metálicos na cabeça do fêmur, meses depois tentou voltar para casa.
Ao passar pelo detector de metais, o servo-croata apitou por todos os poros. Sem falar português, foi levado para uma sala, despido e pesquisado. Convocaram uns cães que farejaram o cara de alto a baixo. Mais sofreria se um policial, que fizera um curso não sei onde, não entendesse o que ele tentava explicar.
Viajo com alguma frequência e tenho motivos para não gostar desses detectores de metal, nem confiar neles. Alguns apitam contra mim, denunciando-me o isqueiro, as chaves, algumas moedas no bolso, coisas assim.
Pior mesmo é que tenho um pente que comprei há anos em Toledo, na Espanha. Tem uma parte metálica onde fica embutido o pente propriamente dito. Às vezes apita, às vezes não. Outro dia, no aeroporto de Roma, ele apitou com estridência — o que me valeu severa inspeção. Temi que chamassem os cães para me farejar.
Nos aeroportos nacionais, o pente já criou problemas. Mas, pelo menos viajo tranquilo, sabendo que o detector cumpriu sua missão. O diabo é quando ele não apita.
Se não me denunciou, o detector de metais deve ter dado bobeira com outros passageiros. Durante as viagens, costumo vigiar os motores do avião, as asas, os ruídos, as nuvens, a cara dos tripulantes, E acrescento um item às minhas preocupações, fiscalizando os companheiros de bordo.
Numa viagem da ponte aérea, o cidadão ao meu lado abriu sua pasta e dela caiu uma peixeira, daquelas fininhas e compridas, que Lampião usava na cintura.
Folha de São Paulo, 5/4/2011