Deus é testemunha de que nada tenho contra os urubus. Gostar mesmo, não gosto. Desde Augusto dos Anjos que eles gozam a fama de azarar a vida dos outros. "Um urubu pousou na minha sorte" é um dos versos mais conhecidos da poética nacional e deve ser citado todos os dias, em contextos diversos.
Em todo caso, voando contra o céu azul, até que são graciosos, fazem curvas suaves no espaço. O diabo é que, justamente nesses espaços, eles estão ameaçando a segurança dos aviões e a vida de todos nós que andamos nesse mesmo espaço, que também é nosso, até prova em contrário.
As estatísticas são apavorantes. Cerca de dois ou três quase-acidentes ocorrem por mês em nossos aeroportos. Justamente na decolagem e no pouso, momentos críticos das viagens aéreas, os urubus se aproximam das turbinas e são sugados. Ou se lançam contra os vidros como suicidas.
Não se pode cercar o ar, erguer muralhas no espaço -que afinal é de todos, inclusive dos urubus. Existem recursos técnicos que eliminariam ou diminuiriam o perigo. O uso de fumaças é caríssimo e nem sempre funciona.
O certo seria deslocar os depósitos de lixo das proximidades dos aeroportos. Aliás, não se entende como o Brasil continua atrasado na questão do lixo -no ano passado, chegamos a receber 1.477 toneladas em contêineres cheios de lixo do Reino Unido-, cuja reciclagem pode transformá-lo em rica matéria-prima.
Há tempos, na hora de pousar no aeroporto do Rio, um piloto teve o para-brisa do seu avião quebrado por um urubu. Os estilhaços quase o cegaram.
Se o urubu tivesse entrado numa das turbinas, naquele momento crítico do pouso, quando a força dos reatores é diminuída, o piloto teria morrido. E todos os passageiros também.
Jornal do Commercio (RJ) ,9/12/2010