O nítido anticlímax eleitoral tomou conta das primeiras semanas de campanha. Seu pano de fundo são os 77% de apoio ao atual governo e as dificuldades de uma oposição clássica para o confronto. E o ativo político do país hoje é desta consciência profunda da mudança acelerada nesta década, a assentar uma visão difusa, mas não menos certeira do voto-opção.
A prosperar a alternativa de Serra, ela se assenta na intrínseca competência do candidato muito mais do que na nitidez do programa oposicionista. Em boa hora, inclusive, o seu Comitê Diretor decidiu não mais publicar a temática completa, mas tão só a proposição sucinta de tópicos no seu site. O álibi é o da insensibilidade do povo a qualquer teor conceitual, nesta altura, de um alinhamento eleitoral.
Serra evita cada vez mais a crítica direta a Lula e ao governo, no reconhecimento dos limites em que possa prosperar a alternativa. A querela foi ao destempero do candidato a vice, Indio da Costa, punido pelo silêncio, depois de ter declarado que veio à campanha “para dizer o que penso”.
O destampatório descambou das clássicas denúncias de corrupção, a que se expõe rotativamente o situacionismo. Indio, entretanto, passa dos descalabros clássicos contra quem está no poder à criminalização, associando o PT às drogas e às Farc. Esse, sim, é o dado inquietante, de uma nova direita brasileira, escondida entre as penas tucanas e, possivelmente, dos beneficiários ainda da iníqua concentração da renda nacional, abalada pelo governo Lula.
Continua a hesitação petista, na proposição de seu programa do imposto sobre as grandes fortunas, indissociável das transferências diretas de renda no processo de desenvolvimento e no êxito do Bolsa Família, ainda na primeira maré de seus resultados. Mais importante, ainda, nesse rumo, é o efetivo deslanche das PPPs, forçando a condução dos recursos bancários ao impulso do desenvolvimento, por sobre as cornucópias de sua prosperidade especulativa. Condenado numa oposição provocatória, já no fechamento da boca de Indio, marchamos para uma alternativa entre duas esquerdas no pleito, ao prevalecer o bom-senso de Serra, sobre as viúvas tucanas do consenso de Washington.
Sabe, sobretudo, o ex-governador paulista que não pode fazer do resultado um plebiscito entre o país das elites sobreviventes e o Brasil do outro lado. Quem sabe, sabe como o povo de Lula. A continuidade, agora, é o prêmio da mudança histórica contra a mera coceira da mudança eleitoral.
Jornal do Brasil, 28/7/2010