Não faço parte do grupo que critica violentamente o Enem. Considero uma boa iniciativa, sujeita a aperfeiçoamentos que
estão sendo providenciados pelo MEC, para este ano. Fazer as provas em duas etapas (em semestres distintos) já protege o exame do seu gigantismo, que torna quase impraticável a sua implementação. Vejam o que aconteceu: 38% dos inscritos não compareceram, dando um enorme prejuízo ao erário, pois as provas foram impressas e havia locais e professores para a eventualidade de uma presença integral. Quem paga pela imprevidência?
O Enem é uma espécie de operação de guerra. A primeira versão foi a tragédia conhecida, com a anulação do con curso, pela falta de cuidados essenciais dos vencedores da licitação, todos inexperientes. Veio a segunda versão, feita agora, e muitas universidades federais se retiraram do processo, diminuindo a importância do exame. Perda de confiança ou falta de tempo? Ficou a dúvida.
O que nos causou espécie, nas segundas provas, foi o aperto geral dado na elaboração das questões. Os alunos sentiram e se queixaram. Não há uma explicação lógica para a mudança de nível, e os técnicos do Inep não vieram apúblico para esclarecer o fato. Aliás, outro erro indesculpável foi o conhecimento de que uma das questões (no 101) deveria ser anulada, por admitir duas respostas, e mesmo assim foi mantida. Prejuízo claro para os alunos, pois perderam um tempo precioso para escolhera opção que seria correta, quando havia duas respostas possíveis. Não se entende por que uma prova assim complexa não tem um gabarito conflá vel. A dúvida jamais poderia ser repassada aos alunos, mesmo que a questão depois fosse anulada. Isso é de uma clara irresponsabilidade, como ficou provado pelas manifestações dos 2,5 milhões de estudantes que fizeram a prova de linguagens, onde ocorreu o fenômeno. Nenhuma desculpa é válida, ainda mais depois do que havia acontecido na pri meira e fracassada versão.
Outra crítica está sendo feita — e se avoluma — pelos professores de língua portuguesa. As questões eram pro— lixas, muito texto, e pouquíssimo apelo aos conhecimentos de gramática. Só o bom senso não pode ser o fator determinante do sucesso.
O que está acontecendo, meio na surdina, é que os lin guistas tomaram de assalto a elaboração das questões e desprezaram, como é do seu estilo, a importância da gramática para o bom conhecimento do nosso idioma. Não dá para justificar essa preferência, a menos que o Inep deseje entrar para a história como o órgão público que acabou com a gramática, nas nossas escolas. De onde terá vindo essa esdrúxula orientação?
Não vamos diminuir a dificuldade de elaborar tantas questões, inclusive com as di— ferentes cores (uatro) que impederji a existencia da antiga cola. E muito trabalho, sabemos disso, mas é preciso começaro processo comtodaantecedência que garanta a lisura e a correção de tudo o que é feito, teoricamente por pessoas altamente qualificadas. Esses erros desmoralizam o empenho do próprio MEC, e todos saem perdendo.
Jornal do Brasil, 14/1/2010