A Academia Brasileira de Letras (ABL) recebeu na semana passada a doação de uma Biblioteca inteira, de 8 mil livros, feita por Eleonora de Menezes, viúva do professor Maurício Bret de Menezes. A doação foi recebida durante uma sessão plenária da ABL, presidida por Cícero Sandroni na presença de 23 acadêmicos, e que teve detalhes comoventes, que merecem ser contados.
Há três meses, na qualidade de diretor das duas bibliotecas da ABL - a Acadêmica Lúcio de Mendonça e a PúbUca Rodolfo Garcia -, recebi a informação de que a Sra. Eleonora Bret de Menezes, moradora de Copacabana, havia decidido doar sua biblioteca à Academia Brasileira de Letras.
Fui à sua residência, na companhia de Adriana Vilaça, nossa bibliotecária-chefe, e lá fiquei surpreso ao deparar-me com uma coleção de 8 mil livros, bem conservados, vários dos quais de autoria dos nossos acadêmicos, além de gravuras, reproduções e coleções encadernadas com recortes de jornais sobre a inauguração de Brasília, em 1960, e o suicídio do presidente Getúlio Vargas, em 1954, entre outros temas importantes.
Eu estava diante de uma viúva, de 84 anos, bibliotecária aposentada da Biblioteca Nacional e freqüentadora da nossa biblioteca Rodolfo Garcia. Disse-lhe o seguinte: "Estou vendo que a senhora não é uma mulher rica. Antes, pelo contrário. Por que, então, em vez de vender estes livros a um colecionador ou a uma livraria de livros usados, a senhora está preferindo doá-los à nossa Biblioteca?
Ela me respondeu que, com o irrestrito apoio dos seus filhos e netos, decidira entregar os livros a uma biblioteca, como a da ABL, onde a memória do seu marido será lembrada e honrada para sempre; e a crescentou: "O professor Maurício Bret de Menezes foi meu marido durante 52 anos, ao longo dos quais compramos todos estes livros, colecionando-os um a um. Ele morreu há três anos. Estou certa de que, onde quer que agora se encontre, ele estará muito feliz com a minha decisão, dos nossos filhos e netos, de entregá-los a uma biblioteca de respeito, como a da Academia.
Aquela era a primeira vez em que nos encontrávamos, mas D. Eleonora confiou tanto em mim que, naquela mesma ocasião, ali me entregou oito caixas com mais de 8 mil fichas do seu acervo. Trouxe-as para a nossa biblioteca, onde elas foram higienizadas e já estão sendo digitalizadas. Na semana seguinte, reuni os Acadêmicos Eduardo Portella, Tarcísio Padilha, Alberto da Costa e Silva e Evanildo Bechara, membros da nossa Comissão Consultiva, que conhecem livros melhor do que ninguém. Quando lhes mostrei uma relação parcial dos livros à nossa disposição, eles ficaram simplesmente estarrecidos diante da importância de muitas das obras que nos estavam sendo doadas.
Alberto da Costa e Silva aconselhou-me então: "Nós temos, antes de mais nada, de comunicar a essa senhora que, a partir de agora, já aceitamos e já estamos agradecendo a sua doação. Depois, veremos onde guardá-la".
Quando comumiquei esta nossa decisão a D. Eleonora, ela ficou na maior emoção e felicidade. Designei então o nosso companheiro Júlio Mendonça para comandar o processo de transferência desse acervo, com os devidos cuidados para não o danificar, e compramos 140 caixas de papelão nos quais esses milhares de livros foram trazidos. Júlio confessou-me depois que muito se emocionara no cumprimento dessa tarefa. Porque cada livro que descia das prateleiras era como se estivéssemos arrancando daquele modesto lar um pedaço de D. Eleonora e de seu marido.
Há duas semanas, levei a nossa Comissão Consultiva ao acadêmico Cícero Sandroni, quando lhe fiz um detalhado relatório de tudo isto. Como resposta, e atendendo a uma sugestão de Alberto da Costa e Silva, o presidente da Academia encarregou-me de convidar D. Eleonora e sua família para receberem, de corpo presente, o agradecimento da ABL.
E foi exatamente isto o que fizemos na semana passada, para que o gesto de D. Eleonora e o nome do seu saudoso marido, o professor Maurício Bret de Menezes, ficassem gravados para sempre em nossos anais e servissem como lição e como exemplo de humilde grandeza, aos quais lhe seremos eternamente gratos.
Já havíamos recebido de D. Eleonora quatro termos de doação, assinados pelo seu filho Pedro Luís, pela sua filha Maria Eduarda, pelo seu neto Bruno e por sua neta Tatiana, com firmas reconhecidas em cartório.
O termo de doação de D. Eleonora foi-lhe entregue pelo presidente Cícero Sandroni, para que ela o assinasse em presença da diretoria da ABL, além de 23 acadêmicos e de todos os presentes a essa reunião plenária e histórica.
Jornal do Commercio (RJ), 21/8/2009